sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Pe. Vicente Vaz

Em os quinze dias do mês de janeiro do presente ano de mil setecentos e vinte e três, faleceu da vida presente, com todos os sacramentos, o padre Vicente Vaz, presbítero natural que era do Casal dos Pereiros, freguesia de Nossa Senhora da Assunção, desta vila de São Vicente da Beira, e morador nesta mesma vila, onde foi cura muitos anos.
Fez testamento solene e aprovado na forma de lei pelo tabelião Nicolau Veloso Ascenso com sete testemunhas, cuja cópia dos legados pios tresladei abaixo deste assento, na forma que se segue. Está sepultado dentro a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção sobredita, de que fiz este assento, no mesmo dia mês e era acima.
O Vigário Estevão Álvares de Pina

Cópia dos legados e disposições do Padre Vicente Vaz
Que o seu corpo seja sepultado na igreja desta vila e que no dia do seu falecimento, sendo hora, se lhe digam duas missas de presente, e não sendo horas, ao outro dia, por esmola, cada uma, de cento e vinte réis. E se lhe faça um ofício de nove lições(?) ao sétimo dia do seu falecimento.
Que se lhe digam pelas almas de seus pais quatro missas; pela alma de António Lourenço, duas; pela alma de sua tia, a Ruyva(?), do Ninho do Açor, duas; pelas almas de suas irmãs, duas missas; pelas penitências mal cumpridas, quatro; pelas almas dos mais defuntos seus parentes, quatro.
Deixa a Francisco Lopes de Carvalho, seu afilhado, pelo amor de Deus e descargo da sua consciência, pelo terem servido, um souto ao Vale de Pero Lourenço; uma terra com seu fruto à Ribeira Queimada; uma vinha na Mata; a metade da silha da Barroqueira, para ele ali poder por suas colmeias; mais lhe deixa dez colmeias; a sua espingarda; dois potes, um de ter vinho e outro de ter azeite; mais um baú que tem mais um alqueire de linhaça; e quanto o que o dito tiver seu naquela casa onde ele mora o poderá tirar sem o ninguém impedir.
Deixa a seu sobrinho Manuel Vaz quatro colmeias e assento para elas no fundo das Barrocas (…).
Deixa a sua sobrinha Francisca um souto ao Pisão desta vila, a metade do Valinho, com suas oliveiras e mais quatro colmeias.
Deixa a sua sobrinha, mulher de Domingos Freire, de Almaceda, uns castanheiros na Barroca do Mourelo.
Deixa a seu sobrinho José Pires a metade da Barroca do Freixo, porque a outra metade é da capela.
Deixa a Manuel Figueira, dos Pereiros, casado com sua sobrinha, o chão que tem nos Pereiros, com suas árvores e casa que nele fez; mais uma tapada grande à ribeira dos mesmos Pereiros, com obrigação de cinco missas para sempre. E tendo filho que se ordene lha porão em património (…). Porém, nestes primeiros dois anos depois do seu falecimento, se lhe dará em missas, por sua intenção, todo o rendimento da dita tapada. E de tudo o mais institui como universais herdeiros Manuel Figueira e sua mulher.
Declara que deve à irmandade de São Pedro, desta Vila, quatro mil e oitocentos réis. E que acompanhem seu corpo as confrarias e a cada uma se dê um alqueire de centeio.
E não consta mais do dito testamento, o qual foi feito pelo Doutor Manuel Simões, a dez de fevereiro de mil setecentos e vinte e dois e aprovado no mesmo dia e era pelo tabelião Nicolau Veloso Ascenso, sendo testemunhas presentes, que na aprovação o assinaram, o Pe. Miguel de Abreu, Francisco de Azevedo Cabral e Pina, João Batista Marques, Manuel Rodrigues(Roiz) Calvo, Francisco Rodrigues(Roiz) Fróis(Fraes?), Manuel Leitão, Bernardo da Costa, ao que tudo me reporto.

Fez mais um codicilo em sete de janeiro do presente ano de mil setecentos e vinte e três, no qual mandou que de vinte alqueires de centeio que lhe devia seu herdeiro Manuel Figueira deixa a sua irmã viúva Maria Fea, oito alqueires, à mulher do dito Manuel Figueira, quatro alqueires, ao afilhado Francisco Carvalho, cinco, à irmandade de São Pedro, um, e à do Santíssimo, um. E à do Santo Cristo um alqueire de azeite e que no dia do seu falecimento se lhe digam duas missas por sua alma, de esmola de cento e vinte réis, que pagará seu afilhado Francisco Lopes de Carvalho, de setecentos e noventa réis que havia pago do concerto das casas.
O qual codicilo foi feito por mim vigário, ao qual estiveram presentes e nele assinaram Valentim Peres, Simão, solteiro, criado de Bartolomeu Peres, Manuel, solteiro, filho de Manuel Mendes Mouco, todos moradores desta vila. E a entregaram os próprios ao dito herdeiro Manuel Figueira, no dia 18 de janeiro do dito ano, o qual assinou aqui comigo.
São Vicente da Beira, dia, mês, e era ut supra.

O Vigário Estêvão Álvares de Pina
Manuel Figueira

Notas:
- O Vigário Estêvão Álvares de Pina era um Familiar do Santo Ofício. Foi contemporâneo do Pe. Manuel Simões que investigou o passado de Alexandre Henriques, em São Vicente da Beira, como comissário da Inquisição, segundo a autora do estudo apresentado há dias.
As principais funções dos Familiares estavam ligadas à máquina policial do Santo Ofício, cabendo-lhes executar as prisões de suspeitos de heresia, sequestrar os bens dos condenados, nos crimes em que coubesse confisco, e efetuar diligências a mando dos inquiridores.
- O tabelião que registou o testamento do Pe. Vicente Vaz chamava-se Nicolau Veloso Ascenso. Seria familiar de Nicolau Veloso de Carvalho, que casou com Maria Cardoza Frazão, em 1698. Era filho de Manuel Leitão(?) de Carvalho e de Maria Távora. Um deles deu o nome à atual rua Nicolau Veloso. 
José Teodoro Prata


4 comentários:

Anônimo disse...

Caríssimo,
"(...) ametade da silha da Barroqueyra pera elle ali poder por as suas colmeas (...)", em que silha = pedra em que assenta o cortiço das abelhas.
Cumprimentos,
HM

Anônimo disse...

E mais:
"(...) e dous potes hu de ter vinho outro de ter azeyte, mais hum baul q tem mais hu alqueyre de linhaça (...)", sendo baul = baú.
HM

Anônimo disse...

E ainda outro acrescento:
De facto é Maria "Fea" (ou Maria "Feya", depende de quem escrevia o seu nome). Era casada com Miguel Pires natural do Freixial do Campo. Ele faleceu em 1720 e ela em 1734, ambos nos Pereiros. Maria Feia e o P.e Vicente Vaz eram filho do casal António Lourenço (natural do Padrão) e Breatriz Vaz (natural dos Pereiros).
Cumprimentos,
HM

José Teodoro Prata disse...

Obrigado ao Hugo Martins, pelas achegas que aqui nos deixou (já corrigi) e também por me ter informado da existência deste testamento.
O Hugo Martins é o autor do site do Mourelo.