segunda-feira, 5 de setembro de 2016

O nosso falar: restolhada

O restolho sabemos o que é: parte inferior dos cereais que fica depois da ceifa.
Restolhada pode ter um sentido coletivo, pois designa o conjunto de todo o restolho. Também se refere às espigas que caem e ficam no meio do restolho. Mais habitualmente, designa um barulho idêntico a passos a atravessar uma seara ou o restolho.
Um dia ao fim da tarde, parti para o Alentejo com o meu cunhado Joaquim Teodoro. Íamos carregar um camião de fardos de palha.
Chegámos ao campo já de noite, comemos qualquer coisa e estendemo-nos em cima de uma manta, junto ao tronco de uma azinheira, à espera da claridade do amanhecer.
Esse é um outro significado de restolhada: conjunto de pessoas a dormir no chão. O termo terá tido origem nas ceifas, pois era assim que se dormia nos campos. Por outro lado, dormir no campo, no chão, em cima de umas mantas, era habitual nos nossos antigos, desde que o tempo estivesse seco. E com um pouco de palha por baixo ficava melhor. Também nas festas familiares, vinham parentes de longe e era necessário acomodá-los. Então estendiam-se umas mantas no chão de sobrado ou até no térreo da loja e por umas noites desenrascava. Era uma restolhada de gente!

José Teodoro Prata

4 comentários:

Anônimo disse...

Não sei se é da idade(se calhar é)o calor este ano tem sido "desmarcado".
Nos anos setenta do século passado; "já lá vai um ror danos" o cimo de vila ainda tinha um certo movimento geracional, as casas eram quase todas habitadas.
Senhoras e senhores:- Ernesto Feijão;t`i Maria Carvalha; prima Maria da Esperança; Mónica; José Maria Prata; Minha sogra; Agostinho sargento; Maria José Lopes; João Carvalho; António lituardo... cônjuges, filhos
Depois da ceia os vizinhos começavam a sair dos seus lares com uma manta na mão estendiam-na na rua onde se dormia até madrugada.Eu também fazia o mesmo, aquilo era uma restolhada de gente cada um esticado para seu lado,o falaçar aos poucos dava lugar ao ressonar
Às tantas da madrugada quando começava a arrefecer, as pessoas recolhiam às suas habitações
Os mais velhas dizem-me que noutros tempos a vizinhança dormia debaixo das oliveiras que existem no cimo da vila. Cada família acomodava-se como podia
JMS

Anônimo disse...

Nessa forma natural de vida, de contacto direto com a terra mãe, os antigos, sem o saber, reequilibravam a sua energia e os seu campo magnético. Na nossa sofisticada modernidade a viver em gaiolas e a deslocar-mo-nos em caixotes de aço sobre pneu o contacto direto com a mãe terra praticamente desapareceu, salvo no período de férias em que nos descalçamos e passeamos na praia quase sem roupa, a mostrar ou a esconder as tatuagens como o nosso Sebastião Baldaque, damos uns mergulhos ou subimos a Gardunha a pé até às antenas onde confortamos o estomago com a merenda (e a pinguita do Daniel) e a alma com aquele paisagem deslumbrante. Por isso somos mais neuróticos e stressados. Para compensar inventámos os SPAS, para nos besuntarem de óleos, de lamas e nos tirarem as dores com seixos aquecidos.
Eu que não me posso dar a tais luxos tenho uma alternativa bem melhor que é despejar a mina da serra descalço com os pés no rego da água, no meu rico mês de agosto, e depois alcalinizar o organismo com figos corigos e amoras silvestres. De maneiras que é assim.
FB


Anônimo disse...

Era também à restolhada que dormíamos a sesta no Mato Branco, durante o verão. Os meus avós atrás da casa, onde a sombra era maior. As minhas tias mais novas e eu, debaixo da figueira, do lado da presa. Assim que ouvíamos o meu avô a ressonar levantávamo-nos devagarinho e íamos “nadar”. Mas um dia ele acordou antes do tempo e só o vimos vir a correr pela vereda, de correia na mão, a clamar. Saltámos da presa e cada uma fugiu para seu lado, mas ti’Gé deixou-se agarrar e apanhou por todas.
Não me lembro, mas contam que a minha avó ficou tão zangada com o meu avô que andou uma semana sem falar com ele.
Quanto a um comentário à publicação anterior, só mesmo uma alma muito generosa se lembraria de chamar pragmático ao Padre Tomás porque aceitou fazer um batizado por vinte escudos, o dinheiro que um homem ganharia por um dia a ceifar desde que se visse até para lá do sol posto…

M. L. Ferreira

José Teodoro Prata disse...

Zé Manel: Desconhecia esse hábito de dormir na rua e nos quintais, à restolhada, nas noites escaldantes.

Libânia: Não foi por bondade, simplesmente não fiz contas, não pensei em quanto se ganharia ao dia, nessa época. Só pensei no desconto, nos saldos (frutos destes tempos).
Afinal era um ganancioso, mas isso já nos sabíamos (alguém nos sabe aqui contar a venda de tantos santos, já que o meu primo João Prata não se decide a fazê-lo?; outro que de certeza o sabe é o Ernesto, pela sua proximidade com o sacristão, o senhor António Maria...).

Chico: Fizeste-me inveja com essa rega descalço, ainda por cima com água de uma mina, fresquíssima. Na apresentação do meu último livro, em Castelo Branco, afirmei que o livro podia ter sido escrito pela Dra. Adelaide Salvado, a quem queria homenagear. E acrescentei que isso só era impossível porque para o fazer era necessário ter sentido a maresia das regueiras nas madrugadas do estio. Acho que poucos perceberam o que eu queria dizer.
E os figos corigos, os meus preferidos...