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quarta-feira, 13 de julho de 2016

Somos todos primos

Para quem é de fora, é difícil acreditar quando dizemos que, cá na terra, somos todos primos. Para nós, que crescemos com esta verdade, nem nos passa pela cabeça pô-la em causa.
Esta é a minha contribuição para provar que assim é. Recuei apenas à minha trisavó materna, Maria Castanheira, e, pelo número dos descendentes do seu segundo casamento até à minha geração, é fácil concluir que estaremos quase todos unidos por laços familiares mais ou menos próximos.    

Maria Castanheira nasceu no Souto da Casa no ano de 1844, filha de António Castanheira e Rosaria Maria da Costa Domingues.
Casou em 1865, com Lucas Martins, exposto na roda de Alpedrinha e dado a criar no Souto da Casa. Ela tinha vinte e um anos e ele quarenta e quatro.
Deviam ser boa gente e uma mulher e homem d’ armas, que pegaram na trouxa e vieram morar para S. Vicente. Viveram uns anos na Rua Nicolau Veloso, ela doméstica e ele criado, e aí lhes nasceram as duas primeiras filhas:

1 - Mariana (1865) que herdou o nome da madrinha, Mariana Robles Monteiro (é provável que o pai fosse criado daquela família). Casou com Joaquim António Craveiro e tiveram oito (?) filhos:

                        Francisco (1885)
                        Auta (?) (1887)
                        Álvaro (1888)
                        Patrocínia (1890)
                        António (1893)
                        Joaquim (1900)
                        Maria de Lurdes (1904)
                        Maria da Conceição (1905)

2 - Maria (1887) que terá morrido ainda criança.

Maria Castanheira e Lucas Martins mudaram-se para a Rua da Cruz e foi aí que lhes nasceu o terceiro filho:

3 - António (1872/1951) que casou no Souto da Casa com Josefa dos Santos.

(Deste ramo da família de Maria Castanheira descenderão os irmãos Craveiro, pelo que ficam aqui com muito trabalho para fazer...)

Maria Castanheira enviuvou de Lucas Martins em 1880 e casou com José Carvalho em Maio de 1881. José Carvalho, natural de Freixedo, Santa Comba Dão, tinha cinquenta anos e era também viúvo. Tiveram uma filha:

Maria da Conceição Carvalho, mais conhecida por Maria Carvalha (1882/1954). Foi uma das minhas bisavós e é a pessoa da família de quem tenho memórias mais remotas. Lembro-me dela na casa da rua Velha e a caminho da Oles, de saias rabudas e sempre de cesta enfiada no braço. Diz que era para apanhar as bostas com que estrumava a horta.
Casou aos dezassete anos com José Fernandes Trindade, de vinte e cinco, solteiro, cultivador, e tiveram cinco filhos:

Maria Carvalha (?) com alguns dos filhos e netos

1 - Maria do Rosário Carvalho (1901); diz que era parecida com a mãe no corpo, mas sobretudo no génio lutador e no amor pela sua Oles, onde via o dia a nascer e donde regressava já noite escura. No verão tinha a casa sempre cheia de netos, filhos e noras que todos os anos vinham passar férias, mas sobretudo ajudar nas hortas e na vindima.

Casou com José Fernandes Candeias, também ele um bom homem, trabalhador e amigo da família. Contam que um verão, só de imaginar que os filhos podiam estar a comer pão seco, passou o tempo todo a olhar para uma chouriça que a mulher lhe tinha posto na merenda que levou para o quinto, sem coragem de a comer. Quando voltou trazia-a inteira e comeram-na todos à ceia, uma talhadinha para cada um.

Maria do Rosário com o marido, no dia em que festejaram as Bodas de Ouro

Maria do Rosário e José Candeias tiveram sete filhos:

            João de Deus - Casou em primeiras núpcias com Deolinda Torres, com quem teve dois filhos: Teresa Candeias e Luís Candeias. Depois de enviuvar casou com Edite Pinto. Deste casamento não teve filhos. 

            Joaquim Fernandes Candeias - Casou com Ilda Saraiva, com quem teve três filhas: Luísa Maria Saraiva Fernandes Candeias (Alves) ;  Teresa Maria Saraiva Candeias (Rodrigues)  e Anabela Saraiva Candeias (de Assunção);
           
            Guilhermino Candeias - Casou com Maria de Jesus Candeias e tiveram tês filhos: João Manuel dos Santos Candeias, José Carlos dos Santos Candeias e Ana Paula dos Santos Candeias;
           
            Luís Candeias - Casou com Maria da Conceição e tiveram duas filhas; Filomena Candeias e Maria José Candeias;

            António Maria Candeias - Casou com Maria Augusta Vide  e tiveram dois filhos: Nuno Filipe Vide  Candeias e Maria Margarida Vide Candeias;

            Francisco Candeias - Casou com Lúcia Moura e tiveram dois filhos: Paulo José Moura Candeias e Carla Alexandra Moura Candeias;

            Maria José Candeias - Casou com José Afonso Reis e tiveram dois filhos. Ana Cristina Candeias Reis e Bruno Candeias Reis.
           
2 - Guilhermino Fernandes (1902) Um lindo homem, com um coração que não lhe cabia no peito. Quem queria, era vê-lo de charrua na mão ou à frente do carro de bois, sempre dum lado para o outro. Mas aos domingos, depois da missa, passava as tardes na sociedade com os amigos, e quando chegava a casa, noite alta e a cantar, tinha que ser algum dos filhos ou dos netos a descalçar-lhe as botas. A tocar os pratos, na banda, ninguém o igualava, sobretudo na alegria e gosto que tinha pela música.
Casou com Maria José dos Santos, uma santa mulher. Ouvi muitas vezes dizer que no tempo da guerra ajudou a dar de comer a muita gente; e no verão não era só o homem e os filhos que espreitavam a ver se já lá vinha ao fundo do caminho com o cesto da merenda à cabeça: havia sempre uma malga de sopa ou um prato de batatas ou feijões a mais para alguém que andasse ali por perto com fome. Para além dos muitos filhos que teve, ajudou também a criar alguns dos mais de trinta netos.

Guilhermino com o filho Joaquim

Guilhermino e Maria José tiveram nove filhos:

            Joaquim Fernandes - Casou com Maria Angelina e tiveram cinco filhos: Maria da Luz Fernandes, Maria José Fernandes, João Fernandes, José Manuel Fernandes e Maria do Carmo Fernandes;

            Maria da Luz dos Santos - Casou com Luís Moreira e tiveram quatro filhos: Maria Libânia S. Moreira, António S. Moreira, José Manuel S. Moreira e Maria José da Luz Moreira;

            Albertino Fernandes - Casou com Maria Ascensão Moreira e tiveram cinco filhos: José M. Fernandes, Luís M. Fernandes, Guilhermino M. Fernandes, Maria da Nazaré M. Fernandes Maria de Fátima M. Fernandes

            Maria Esmeralda Fernandes - Casou com Luís pinheiro e tiveram quatro filhos: Maria Manuela F. Pinheiro, José F. Pinheiro, Maria de Fátima F. Pinheiro e Cristina F. Pinheiro;

            Maria Libânia Fernandes (morreu ainda jovem);

            Maria Patrocínia Fernandes - Casou com António Tomé; não tiveram filhos;
            
Maria José Fernandes - Casou com João Jacinto e tiveram cinco filhos: António F. Jacinto, José F. Jacinto, Maria de Fátima F. Jacinto, Maia Teresa F. Jacinto e Manuel F. Jacinto;

            Maria Leonor Fernandes - Casou com João Caio e tiveram seis filhos: João F. Caio, José F. Caio, Maria de Fátima F. Caio, Luís F. Caio e Cristina F. Caio;

            Maria Adelaide Fernandes - Casou com Jaime Silva e tiveram três filhos: Isabel F. Silva, Pedro F. Silva e Cláudia F. Silva.

3 - Benevides Fernandes (1904) Um excelente homem, trabalhador e amigo de ajudar quem precisava. Dado à paródia, tinha sempre uma graça para tudo.
Em novo, ainda solteiro, trabalhou na agricultura e depois na construção dos caminhos de ferro. Casou com Maria Sabina Ramalho e abalaram para Lisboa onde a fama de artista como jardineiro o levou a trabalhar na casa de muita gente influente da sociedade lisboeta daquele tempo.

Benevides Fernandes

Benevides e Sabina tiveram um filho:

            João Fernandes - Casou com   Maria da Conceição Azevedo  e   tiveram um filho: João Fernandes.

4 - Maria de Jesus - Mulher meiga, generosa e sempre de sorriso nos lábio, mas também uma mulher de armas. Contam que numa noite de invernia lhe bateu à porta um homem a pedir alguma coisa de comer. Depois de lhe ter aconchegado a barriga e aquecido a roupa ensopada, reparou-lhe na falta de dedos numa das mãos; viu logo que era o Pistotira, que por aqueles tempos era o terror das gentes da Vila e arredores. Mandou um dos filhos, ainda criança, a chamar o pai à taberna do Arbotes, e foi assim que prenderam o malfeitor. Casou com José Maria Prata, primo direito, e tiveram seis filhos:

            António  Miguel Rodrigues - Casou com Maria Manuela Duarte e tiveram um filho-João Manuel  Duarte Rodrigues;

            João Maria Rodrigues - Casou com Maria Leonor  Duarte e tiveram dois filhos: Maria Fernanda Duarte Rodrigues e João Francisco Duarte Rodrigues;

            Maria Fernanda Rodrigues - Casou com Arnaldo Coutinho e tiveram duas filhas: Ana Cristina Rodrigues Coutinho e Carla Alexandra Rodrigues Coutinho;

            José Carvalho Prata – Não casou nem teve filhos


            Maria de Jesus  Prata - Casou com Miguel Hipólito Jerónimo e tiveram duas filhas: Carla Prata Jerónimo e Ana Margarida Prata Jerónimo;

            Miguel Carvalho Prata – Casou com Maria José Lourenço Prata e tiveram um filho: Luís Miguel Lourenço Prata.

5 - Maria dos Anjos (1907) - uma das pessoas mais generosas que conheci. Abalou cedo a servir para Lisboa, e por lá casou e ficou a viver. Na casa dela, pequenina, a porta estava sempre aberta e havia sempre lugar para mais uma cama ou um prato à mesa para quem precisasse. Raros foram os irmãos ou sobrinhos que não lhe tivessem batido à porta. E contava histórias como ninguém. Foi com ela que aprendi a Formiga Rabiga e a Cabra Cabrez.
Casou com Francisco Martins que com ela partilhava a generosidade e o amor à terra que adotou como sua. Nos últimos anos de vida já pouco cá vinham, mas, sempre que encontravam portador, mandavam visitas para toda a gente. Tiveram duas filhas:

            Liliana Martins - Casou com José  Rodrigues e tiveram dois filhos: José Rodrigues  e António Rodrigues; 

        Maria José Martins - Casou com António Pinheiro e tiveram dois filhos: Joana Martins Pinheiro e Gonçalo Marins Pinheiro.
           
Maria da Conceição Carvalho enviuvou de José Fernandes e casou com Joaquim Marques, do Louriçal do Campo, em 1914. Tiveram três filhos:

       Leonor de Jesus -  Casou com José Ramalho e tiveram um filho: João Ramalho – Teve dois filhos.

           Ana Marques - Casou com José (?) e tiveram  um filho: Vítor Carvalho que não teve filhos.

           João Marques – Lembro-me de o ver a subir a rua Nicolau Veloso, ao fim do dia, com as ferramentas de resineiro às costas. Lembro-me também que vivia em frente do Convento, numa casa que era o meu limite no avanço pelo Cimo de Vila. À janela estava sempre uma das filhas, com olhar estranho, os cabelos que nem palha, a balançar-se. O medo que aquilo me metia, a mim e às outras cachopitas da minha idade. Mesmo assim subíamos muitas vezes a rua e púnhamo-nos cá de baixo a fazer-lhe caretas. Ela ficava ainda mais agitada e arrepelava os cabelos, e nós fugíamos pela rua abaixo.
Ao longo da vida lembrei-me muitas vezes desta e doutras cenas, motivadas pelo medo, pela ignorância e por alguma crueldade própria da infância. Não lhes serviu de nada, mas muitas vezes dei comigo a abraçar os meus alunos e a pensar no mal que fiz a esta minha prima, ao Chalim, à Dita e a outras pessoas da nossa terra que nasceram diferentes, num tempo em que a deficiência era ainda entendida como qualquer coisa de demoníaco, da qual tínhamos que nos proteger. 
João Marques casou com Maria do Rosário e tiveram quatro filhos: Maria do Rosário Marques, Luís Marques, Isabel Marques e Maria da Luz Marques.
João Marques enviuvou e voltou a casar com Maria da Luz. Tiveram quatro filhos: Maria João Santos, Paula Marques, Maria dos Anjos Marques e Nuno Marques.

Maria Castanheira enviuvou de José Carvalho e casou com António Prata em 1884 (Este ramo da família de Maria Castanheira está referido em Prata 2 – Os avós mais novos). Contam que no dia do casamento, durante a troca de alianças, ela se terá atrapalhado por não saber em que dedo havia de a enfiar. Depois, para se desculpar, terá dito: «Também não é todos os dias que uma pessoa se casa…», ela que se tinha casado três vezes! O mais provável é nenhum dos noivos anteriores lhe ter oferecido uma aliança e ter usado uma emprestada no dia do casamento, como era vulgar naquele tempo.
Para além dos muitos filhos que teve, Maria Castanheira foi parteira e ajudou a nascer muitas crianças. Foi também ela que acareou e criou alguns dos meninos expostos na roda da Vila, ao cimo da rua da Cruz, onde morava.
Mulher de vida cheia e coração grande, terá sido dela que muitos dos filhos e netos herdaram as qualidades de que tantos de nós, seus descendentes, pudemos beneficiar.  

Nota: Esta pesquisa está em aberto, aguardando a contribuição de quem possa ajudar a corrigir alguma informação que não esteja correta, ou a acrescentar dados e documentos a que complementem. 

M. L. Ferreira