Estes relatos de milagres
relacionados com a água da Senhora da Orada, recolhidos por Albano de Matos e
aqui divulgados pelo José Teodoro, aconteceram num tempo em que a medicina não
tinha atingido o estado de desenvolvimento que hoje conhecemos e, principalmente,
não estava acessível à maioria da população. Não admira, por isso, que as
pessoas se agarrassem tanto à religião e encontrassem explicações sobrenaturais
para muitos acontecimentos das suas vidas. Embora de forma intuitiva, acho que
já se pode falar da crença defendida atualmente por muita gente, de que a fé,
aliada à ciência, faz milagres. E não é apenas no campo da saúde…
Para além das situações
descritas, quase todos conhecemos histórias parecidas que reforçam a ideia da
importância da fé e confirmam os poderes milagrosos da água da Senhora da
Orada. Aqui fica a minha:
Durante muitos anos os meus
avós maternos trouxeram o Mato Branco à renda. No tempo frio viviam na Vila,
mas na Primavera, numa espécie de transumância humana, rumavam à fazenda de
onde só regressavam no final do Verão. Acho que era uma prática comum nessa
altura.
Era durante esse tempo quente
que a minha avó aproveitava para cumprir todas as promessas que fazia à Senhora
da Orada durante o ano. E não deviam faltar-lhe motivos para promessas porque
os filhos eram muitos, as dificuldades enormes e a fé na Senhora ainda maior.
Aproveitava a hora em que
todos os outros dormiam a sesta e lá ia ela, descalça (fazia parte da promessa,
mas se calhar porque também poupava as alpargatas), caminho acima até ao
santuário onde rezava pela intenção devida. Depois dirigia-se à fonte e bebia a
água que, acreditava, curava todas as moléstias do corpo. E era assim durante
nove dias seguidos.
Normalmente as promessas eram
por problemas com algum dos filhos, pela saúde do seu Guilhermino, pelo sucesso
das colheitas ou malinas nos animais. Mas houve um ano em que foi por intenção da
minha própria avó: já há algum tempo que andava a perder o ouvido e estava a
ficar completamente mouca.
Durante oito dias lá foi ela,
pela torreira do Sol, até à capela onde rezava as orações devidas. Depois, na
fonte, lavava a cara com muita fé nos poderes milagrosos daquela água. Ao nono
dia, último da novena, ao chegar ao fundo do terreiro, deu-lhe uma coisa e caiu
redonda no chão. Não sabe quanto tempo esteve desmaiada, mas quando veio a si
ouvia lindamente todos os sons que havia à volta.
Foi à capela agradecer a
graça recebida e voltou para o Mato Branco em pranto e a gritar: Milagre!
Milagre! A Nossa Senhora curou-me!
M. L. Ferreira
Nota: Não sei se já era
nascida quando estes factos aconteceram, mas, em criança, lembro-me de ouvir a
minha avó contar algumas vezes esta história. Agora foi-me recordada por uma
tia que a contou mais ou menos pelas palavras com que a escrevi.