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sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Praças

Numa discussão entre uma sanvicentina e uma tinalhense, cada qual defendia com unhas e dentes os pergaminhos do respetivo berço. Uma porque São Vicente até tinha tido a Casa da Câmara; a outra porque sim senhora, mas também lá tinham tido a Casa da Malta. A de cá porque não havia como a Senhora da Orada; a outra porque havia lá santa mais linda que a Rainha Santa Isabel! E casas antigas? E gente importante? E histórias? Um nunca mais acabar, dum lado e do outro.
Ao fim de algum tempo, a nossa baixou um pouco o fervor com que defendia São Vicente, até porque, em boa verdade, reconhecia em Tinalhas uma das aldeias mais bonitas das redondezas.
- Mas não têm é uma Praça tão linda como a nossa! – foi o último argumento da de cá.
- E onde é que os de São Vicente alguma vez tiveram uma praça como a que nós cá tínhamos antigamente? Olhe, vendia-se lá de tudo: hortaliças e frutas de toda a qualidade; carne, vinho, azeite, leite de cabra e de vaca, que até nos perguntavam logo de qual é que queríamos; queijos frescos e curados… Neste tempo as melancias eram tão grandes que era preciso os braços de um homem para as abraçar. Era uma fartura de tudo! Vinha gente de todo o lado a abastecer-se e todos os dias ia uma carroça cheia a vender na praça de Castelo Branco.
Era além, onde está aquele portão grande. É uma pena é agora estar naquele estado, mas o que é que se há de fazer? Naquele tempo dava trabalho a muita gente. Entre pastores, criados de fora e de dentro, pessoal que vinha só no tempo da azeitona, da monda ou das ceifas, era uma tormenta de gente. Mas agora já ninguém quer saber da terra e está tudo ao abandono…




Painéis de azulejos que ladeiam o portão da Casa Agrícola de Tinalhas. Verdadeiros os dizeres do segundo painel e, não fosse a imagem da criança a guiar a charrua e a miséria em que viviam os trabalhadores agrícolas, apesar de trabalharem como escravos, até apetecia dizer que naquele tempo é que era…


Retrato do 1.º Visconde de Tinalhas, José Coutinho Barriga da Silveira Castro da Câmara, pai de Tomás Aquino Coutinho Barriga da Silveira Castro e Câmara, que foi presidente da Câmara de São Vicente da Beira e protagonista da história “Um herdeiro”, aqui publicada em dezembro passado.


M. L. Ferreira