sexta-feira, 26 de novembro de 2010

A Terra do Futuro


Numa das minhas últimas idas a São Vicente, várias pessoas me expressaram a sua angústia pelo rumo que a nossa terra está a tomar. Uma queixou-se de não haver médico todos os dias, às vezes nem uma vez por semana, outra de o pároco residir em Almaceda. Por esses dias, também o Presidente da Junta partilhou comigo a sua preocupação pelos resultados do próximo censo, a iniciar no mês de Março. Nalgumas localidades da freguesia, tem havido uma autêntica sangria de gente jovem que opta por ir viver para fora, sobretudo nos centros urbanos.
Não há padres e médicos suficientes para manter as realidades do passado, mas também é verdade que a freguesia de S. Vicente da Beira não tem a população que teve durante o século XX. Poucas ruas de S. Vicente têm mais do que duas ou três famílias residentes e é habitual percorrer algumas e não ver vivalma.
E, de certa forma, era difícil fazer melhor, nos últimos anos: criação da EBI, como centro escolar regional; reconversão do Hospital em Lar e Creche; fundação da empresa Fonte da Fraga; abertura da delegação de Bombeiros. No seu conjunto, estas novas instituições garantem o ganha-pão a muitas famílias!
Mas as crianças são cada vez menos e o benefício da criação da EBI pode estar preso por um ténue fio de alguns anos. Enquanto as povoações a menos de 20 km de Castelo Branco sustiveram o declínio, pela sua transformação em dormitórios da cidade, S. Vicente da Beira fica demasiado longe para compensar o ir e vir.
O turismo regional é débil, mas há gente e povoações com projectos de sucesso. Nós, nem projecto ainda temos. A Senhora da Orada é um dos locais da região com maiores potencialidades turísticas (património religioso, artístico, histórico, paisagístico), mas sinto um virar de costas. As obras de requalificação do espaço envolvente, sanitários e bar, há tanto prometidas, ficaram esquecidas nos gabinetes. O altar-mor, talvez o mais bonito altar da freguesia, trazido da Igreja de Francisco do convento feminino, continua a apodrecer e brevemente a sua perda será irreversível.
Mas o futuro está na terra. Não só a agricultura de subsistência, de agricultores de fim de semana ou mesmo daqueles que lá moram, mas ganham a vida noutra actividade. Esta agricultura, que nos dá os sabores com que fomos criados, é muitíssimo importante, tanto em termos de qualidade alimentar como de poupança. Mas não fixa ninguém. Se não houver uma outra fonte de rendimento, as pessoas partem, como continuam a partir.
A ideia não é minha, ouvi do Professor Marinho Santos, natural das Sarzedas e catedrático na Universidade de Coimbra. Defendia ele que o mundo rural só tem futuro se a agricultura não morrer e eu acrescento que ela tem de ser a principal fonte de rendimento dos moradores das nossas aldeias.
Em Castelo Branco, consomem-se sobretudo hortaliças e frutas espanholas, mas as terras férteis dos nossos vales ribeirinhos estão parcialmente abandonadas. No entanto, as nossas frutas (cerejas, maça bravo de esmolfe…) e legumes são de excelente qualidade. E é com o leite das nossas ovelhas que se fazem alguns dos prestigiados queijos regionais. Já em 1889, João dos Santos Vaz Raposo levou o nosso azeite à Exposição Universal de Paris e veio de lá galardoado.
A I Feira de Gastronomia e Artesanato, a todos os títulos exemplar, como aqui escrevi, teve também o dom de pôr a nu as nossas fragilidades: os nossos standes pareciam os de um centro urbano, em que a indústria e os serviços predominam. Queijo, feijão, chouriços e vinhos foram vendidos por produtores do Sobral, Ninho…
Sei que não é fácil e que nem agricultor de fim de semana chego a ser, para ter a veleidade de falar com autoridade. Também sei que produzir para o mercado exige uma boa planificação prévia, sob pena de ter de lançar fora e ir imediatamente à falência.
Mas a terra está a dar bom rendimento na região. A comunicação social (Jornal do Fundão, Reconquista, Visão) tem, nos últimos dois anos, feito eco de excelentes experiências agrícolas nas duas vertentes da Gardunha, tanto no ramo da fruticultura como da produção de hortícolas. Algumas delas, de jovens agricultores, são um verdadeiro sucesso.
Nesta época de crise e desemprego, temos de olhar para a terra como uma fonte de rendimento, como uma solução de futuro. Até os políticos voltam a falar no regresso às indústrias familiares e à actividade agrícola. É uma boa solução para o país e, para nós, é na terra que está o futuro, sob pena de não termos futuro, como comunidade.


2 comentários:

Anônimo disse...

Totalmente de acordo e temos que encontrar a maneira de ajudar as pessoas que sabem e que podem continuar a trabahlar a terra.
Joao Maria RODRIGUES CRAVEIRO ( PRATA )

Tó Sabino disse...

Boa Noite Zé Teodoro
Como qualquer Vicentino que goste da sua terra e que se preocupa com o seu desenvolvimento, tenho acompanhado regularmente o meritório trabalho que tens feito na divulgação do que é nosso. Já há algum tempo que pretendo cometar "a desertificação" de que falaste, e muito bem, em Novembro de 2010, e por acaso hoje lembrei-me. A última coisa que devemos fazer é lamentar-mo-nos do abandono de quem cá vive, trabalha e dá emprego. Temos em primeiro lugar, que acarinhar e não escorraçar quem aqui quer ficar e trabalhar, temos que dar valor e ajudar quem investe na nossa terra, temos que por o interesse colectivo à frente do interesse pessoal, temos que fazer muita coisa, mesmo muita, mas pelos vistos a única coisa que se faz... são lamentações.
Abraços e continua.
Tó Sabino