Mostrando postagens com marcador adelaide salvado. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador adelaide salvado. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 1 de março de 2021

Os borborinhos

Requisitei este livrinho na biblioteca da minha escola, a fim de fazer um podcast para a Rádio Castelo Branco, rubrica "História num Minuto", sem saber que ia encontrar algo sobre a nossa terra.

Aqui vos deixo as duas partes do livro onde estão as recolhas realizadas em São Vicente da Beira, pela minha sobrinha Adélia dos Santos, e texto do podcast (não consigo publicar um ficheiro áudio), que foi transmitido pelo RACAB na semana passada.


A investigadora Adelaide Salvado publicou, no ano 2000, um livro intitulado Remoinhos, Ventos e Tempos da Beira, a partir de recolhas realizadas pelos alunos da Escola Superior de Educação.

Nele escreveu sobre o clima das regiões do interior da Beira: «...impedida a entrada das brisas marítimas pelas cadeias montanhosas a ação moderadora das águas do Mar não exerce o seu papel de fator equilibrador das temperaturas do ar. Deste modo, a temperatura atmosférica atinge, no verão, elevados valores ocasionando uma descida acentuada da pressão. O ar quente e leve sobe, então, em rápidos turbilhões para as altas camadas da atmosfera.

A rápida subida o ar levanta folhas e ramos e arrasta a poeira dos campos e dos caminhos.

Nesta atmosfera de elementos em fúria, de céu subitamente toldado e enegrecido e envolto numa temperatura escaldante, temores ancestrais brotam do coração dos homens.»

Os antigos chamavam-lhes remoinhos, esponjinhos, borborinhos, vulvurinhos ou borborinheira. Acreditavam que eram manifestações do diabo e contra ele apelavam ao Senhor e à Senhora do Carmo, a São Bento, ao Menino Jesus, a Deus Pai, ao Senhor da Cruz, à Virgem Maria, a São Jerónimo e à Santa Bárbara.

No Vale da Sertã, os antigos diziam: Vai t´imbora porco sujo, vai à missa.

E em Castelo Branco: Foge, diabo da cruz, que lá vem o Menino Jesus, com uma faquinha amarela, para te cortar a goela.

No Ferro eram mais moderados e mandavam o borborinho para o mar largo, a medir areia com alqueires sem fundo.

José Teodoro Prata

domingo, 17 de julho de 2011

Ladainhas à Orada

Ainda o livro “A ANUNCIAÇÃO À VIRGEM MARIA na religiosidade popular do interior da Beira”, de Maria Adelaide Neto Salvado, recentemente editado pela editora Pelimage.
Nas páginas 86 e 87, a autora escreve:

«Outrora,durante a Quaresma, era prática dos habitantes de Tinalhas, aldeia próxima da Póvoa, deslocarem-se em romagem à ermida de Nossa Senhora da Encarnação.
Até ao início do século XX, era igualmente prática do povo da aldeia de Tinalhas organizar a esta ermida, no 3.º dia das Rogações, que precedem a festa da Ascensão do Senhor, uma participada peregrinação.
Eram as Rogações procissões através dos campos, cuja origem mergulha na Antiguidade, para se implorarem aos deuses condições atmosféricas favoráveis à fertilidade da terra e colheitas abundantes para que não faltasse o pão de cada dia. O Cristianismo adoptou esta prática, dando-lhe uma nova roupagem. Chamou-lhe Ladainhas e fixou a data da sua realização nos dias que antecedem a Quinta-feira da Ascensão. Acompanhado pelo pároco, o povo caminhava em procissão pelos campos em redor das povoações, implorando colheitas abundantes. A benção dos campos culminava o final das preces. Algumas povoações, ultrapassando os limites da sua paróquia, faziam as suas Ladainhas até um santuário da sua devoção.»

Já aqui dei notícia das ladainhas que o povo de São Vicente da Beira realizava à ermida da Senhora da Orada, durante a Quaresma. No final do século XVI, um visitador do bispo da Guarda veio à Vila e deixou escrita, entre outras recomendações, a proibição de os padres acompanharem o povo nas ladainhas que faziam à Orada. Elas terão continuado, já sem os sacerdotes, pois subsistiram até hoje, mas limitadas às ruas de São Vicente.
Outro aspecto em que este texto da Dr.ª Adelaide Salvado faz luz é a ligação das ermidas marianas ao ciclo quaresmal e da Páscoa, também já aqui tratado nos Enxidros.
São mais umas peças para nos ajudarem a completar o puzzle do nosso passado, a fim de o compreendermos melhor.


Ladainha de 2009.
Foto do Dário Inês.

domingo, 10 de julho de 2011

Nossa Senhora da Orada

Ando a ler o livro “A ANUNCIAÇÃO À VIRGEM MARIA na religiosidade popular do interior da Beira”, de Maria Adelaide Neto Salvado, recentemente editado pela editora Pelimage.
Nas páginas 67 e 68, a autora cita J. Pinharanda Gomes e a sua “História da Diocese da Guarda”, para explicar a origem da festa da Anunciação, a 25 de Março. Ambos os autores fazem recuar as origens da festa ao culto pagão da deusa romana Cibele, a Mãe dos deuses, a grande deusa da fertilidade, cujas festas se celebravam a 25 de Março, data em que, ainda na época do Império Romano, a Igreja passou a comemorar a maternidade divina de Maria.
Já na página 69, a Dr.ª Adelaide Salvado escreve:

«Ora, nas manifestações da devoção popular mariana, igualmente, uma estreita relação se estabeleceu entre a Virgem Maria e a fertilidade da terra. Tal como os antigos santuários da deusa-mãe, as ermidas e os santuários erguidos em honra da Virgem Maria que pontuam os campos peninsulares surgem em locais de grande beleza natural, uns junto a nascentes de água com poderes medicinais (61), outros, não raras vezes, associados a lendas que relatam a intervenção da Virgem Maria sobre a fecundidade da terra, ora salvando as searas das pragas de gafanhotos (62), outras trazendo a chuva à terra sequiosa; ora intervindo na sua paragem, quando a sua abundância inundava perigosamente os campos, como acontece com os santuários de Nossa Senhora do Almurtão (Idanha-a-Nova) e de Nossa Senhora de Mércules (Castelo Branco).»

Nota 61: «Sirva de exemplo o caso de Nossa Senhora da Orada (S. Vicente da Beira).»
Nota 62: «Sirva de exemplo o santuário de Nossa Senhora da Azenha (Monsanto da Beira).»


Ribeira da Senhora da Orada.
Fotografia de Filipa Teodoro.