sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Invasões Francesas 6

A guerrilha do Tenente-Coronel Grant

Notas prévias:
1. Devem consultar-se as imagens das publicações de 26 de Setembro (Invasões francesas 5) e de 3 de Setembro (Estrada Nova), a fim de perceber melhor esta publicação.
2. Amanhã, sábado, será publicada a conclusão da presente publicação.


Durante a terceira invasão francesa, o Regimento 30 do Exército Francês, comandado pelo General Foy, passou pela Estrada Nova, em direcção ao Ribatejo e à Estremadura, a fim de ajudar Massena a transpor as Linhas de Torres.
O ambiente no Reino de Portugal era então de sublevação total contra os franceses. O grosso do exército anglo-luso encontrava-se a defender as Linhas de Torres, mas o Tenente-Coronel Grant permanecia na retaguarda, com a missão de dificultar a chegada de reforços ao Exército Francês, que se encontrava num impasse, sem capacidade de abrir caminho para Lisboa.
Segue-se a transcrição de duas cartas do Tenente-Coronel Grant, nas quais relata o ataque de 1 de Fevereiro de 1811 à coluna militar do General Foy, na Estrada Nova.


Carta do Tenente-Coronel J. Grant ao coronel D´Urban. Enxabarda, 2 de Fevereiro de 1811:

«Sede servido referir a S. Ex.ª o comandante em chefe que ontem uma coluna do inimigo, debaixo do comando do General Foy, consistindo em três mil cavalos e infantes de Ciudad Rodrigo, passou pela Estrada Nova, para se unir a Massena. Pernoitou aos 31, em Alcaria, junto do Fundão.
No 1.º deste mês tomei posto em um outeiro junto a esta aldeia, por onde o inimigo devia passar, tendo comigo oitenta ordenanças de Alpedrinha. Fez-se-lhe um bem dirigido fogo por duas horas e terminou somente com a noite.
O resultado foi dezoito mortos na estrada, grande número de feridos e dez prisioneiros. Vários feridos acharam-se mortos esta manhã pela extrema inclemência do tempo.
Também se tomaram diversos carros de trigo e considerável número de bois.
Tendo mandado partidas para picar a frente e a retaguarda do inimigo, tenho razão para pensar que ele deve ter sofrido consideravelmente antes de deixar a estrada nova.
Nós perdemos somente um homem, com poucos cavalos feridos, entre eles o meu.»



Carta do Tenente-Coronel L Grant ao Coronel D´Urban. Fundão, 4 de Fevereiro de 1811:

«Tende a bondade de referir a S. Ex.ª o marechal, que o resultado da acção do 1.º do corrente, junto à Enxabarda, foi mais completo do que eu ao princípio referi.
Acharam-se mortos duzentos e sete do inimigo, aos 2 do corrente, no espaço de quatro léguas, parte dos quais morreu em consequência das feridas e da inclemência do tempo. Estão também em meu poder dezoito prisioneiros (…).
Tenho também que dizer que o coronel do regimento francês 30 e o quartel mestre do mesmo regimento foram achados entre os mortos. O inimigo perdeu a maior parte da sua bagagem e gado.»


Cartas publicadas em Apontamentos para a História do Concelho do Fundão, de José Germano da Cunha, Lisboa, 1892, páginas 87 a 89. O autor extraiu as cartas de Claudio Chaby, Excerptos históricos e collecção de documentos relativos á guerra denominada da península.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Eleições Legislativas 2009


Total nacional:
PS – 36,56%; PSD – 29,09%; CDS – 14,46%; BE – 9,85%; CDU – 7,88%

Distrito de Castelo Branco:
PS – 41%; PSD – 29,72; CDS – 8,37%; BE – 9,08%; CDU – 5,05%

Concelho de Castelo Branco:
PS – 39,12%; PSD – 28,64%; CDS – 8,76%; BE – 11,57%; CDU – 4,88%

Freguesia de S. Vicente da Beira:
PS – 42,66 (398 votos); PSD – 35,05% (327); CDS – 6,43% (60); BE – 6,43% (60); CDU – 2,79% (26)
Inscritos: 1605
Votantes: 933 (58,13%)
Nas eleições legislativas de 2005, a percentagem de votantes foi de 63,1%
Entre 2005 e 2009, o número de elitores inscritos decresceu de 1653 para 1605.

Tal como nas eleições para o Parlamento Europeu, registou-se grande coincidência entre os resultados nacionais e os da freguesia de S. Vicente da Beira. Ver publicação "Parlamento Europeu", de 13 de Junho.

Site consultado: http://www.legislativas2009.mj.pt/

domingo, 27 de setembro de 2009

Esquilos e Javalis


Os esquilos já andam nas nozes!
E os javalis nos pêssegos, nos figos, nas maçãs, nas uvas...
Tenho de pedir ajuda ao protector dos agricultores, aquele cujo nome não pode ser pronunciado (em dia de eleições).
Só ele saberá acabar com a praga!

sábado, 26 de setembro de 2009

Invasões Francesas 5



A pintura é do Reverendo William Bradford e representa um regimento inglês a descer a serra e a começar a atravessar a ribeira de Nisa, em direcção a Vila Velha (de Ródão), em 1811. Na encosta, avistam-se muitos carros de transporte de bagagens, alimentos e munições. Era para esse serviço (e outros) que os nossos carreiros eram requisitados. Clicar na imagem para ver melhor.

Continuamos, hoje, a apresentar os carreiros da freguesia de S. Vicente da Beira que trabalharam para o exército aliado (Portugal e Inglaterra), durante a Guerra Peninsular (Invasões Francesas).

S. Vicente da Beira
Joaõ Leitaõ Canuto andou, com a sua junta de bois e carro, a acarretar feno de S. Vicente para Castelo Branco, durante 9 dias, em Setembro de 1811. Terá feito vários transportes.

Casal da Serra
Joze Francisco, com a sua junta de bois e carro, prestou o mesmo serviço que Joaõ Leitaõ Canuto. Terão andado juntos.

Para saber mais, consultar: "O Concelho de S. Vicente da Beira na Guerra Peninsular", de José Teodoro Prata, publicado pela Associação dos Amigos do Agrupamento de Escolas de São Vicente da Beira, em 2006.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Rotas turísticas


Está a decorrer, por estes dias (ontem, hoje e amanhã), em Castelo Branco, o XIII ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, organizado pela Escola Superior de Educação.
Hoje, sexta-feira, o programa inclui um passeio dos participantes, pela Beira Baixa: C. Branco, Castelo Novo, Lavacolhos, Fundão, S. Vicente da Beira e C. Branco.
A nossa terra entra na rota turística deste importante evento nacional!
Infelizmente, isto é ainda uma novidade, mas deveria ser já uma prática habitual.
A verdade é que pouco temos feito para isso. Limitamo-nos a conservar (nem sempre) o riquíssimo património que nos legaram os nossos antepassados, mas não o divulgamos, não organizamos actividades para o mostrar.
Há algumas iniciativas, mas muito mais poderia ser feito, até para colher as vantagens económicas desta importante actividade económica que é o turismo.
Repito o que já escrevi antes: outros, mais pobres que nós, têm sabido aproveitar muito mais!
Culpados? Todos nós.
Mas hoje é dia de nos alegrarmos e de aproveitar este optimismo para fazermos melhor.


Na Rua Nicolau Veloso

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Festas de Verão 2


A Igreja da Misericórdia, morada do Santo Cristo e da Senhora do Carmo.

(O trabalho previsto para esta semana era outro, mas cheirou-me a maresia e as uvas maduras e lembrei-me dos anos sessenta, os da minha infância.)

As Festas de Verão eram no terceiro fim-de-semana de Setembro, dias depois da Santa Luzia, no Castelejo. Mas os manjares eram preparados muito antes, logo no Inverno, tempo das cabras e das ovelhas parirem.
Nós tínhamos uma cabra, que também tinha cabritos, mas o que pertencia nas Festas era comer o borrego. O meu pai costumava ir ter com o Nonga, o pastor do tio Albano, que mal conseguia falar, mas ele percebia, porque eram amigos, de quando o meu pai também era pastor, em rapaz. O Nonga adivinhava quantos borregos trazia cada ovelha, a apalpar-lhe a barriga. Se houvesse alguma com três, ficava prometido para o meu pai. Então nós comíamos um cabrito da nossa cabra, para lhe podermos juntar o borrego, logo que nascesse.
Às vezes apanhava borreira e curava-se com tiras de casca de trovisco atadas em volta da barriga. Se não morresse, o borrego crescia e em Setembro já estava feito. No sábado, eu e o meu pai matávamos o borrego, já carneiro, e tínhamos carne para a festa. O que se comia primeiro era o sangue cozido, que eu apulara para um tacho. A ceia era omelete de tubras e miolos.
No domingo de manhã, o meu pai gostava de comer a fressura, que a minha mãe fazia na caçola do lume. Depois temperava as massas para assar no dia seguinte e fazia o comer, antes de irmos à missa do Santíssimo Sacramento. O jantar era sopa de massa com carne cozida e carne guisada com batatas fritas ou cozidas e salada de tomate. No fim, comíamos melancia, que comprávamos na Praça, à saída da missa.
O meu pai, com uma ranchada de filhos, comprava muitas melancias. Melancias grandes para os grandes e pequenas para os pequenos, o tamanho dependia de quem as tinha que carregar até à Tapada. Mas as mãos suavam com o calor e a fome amolecia-nos. Uma ou duas iam ao chão e chegávamos a casa com os bocados, às vezes já a comer nelas.
Na segunda-feira festejava-se o Santo Cristo. O meu pai levantava-se cedo, para a alvorada. Fosse para o Quintalinho a ver deitar os foguetes ou à serra a buscar um molho de mato, o tempo da alvorada era religiosamente contado. Pertencia uma hora. Menos uns minutos já eram sinal de Comissão de Festas fraca e as contas acertavam-se à tarde, quando os festeiros andassem a fazer o peditório.
Antes dos foguetes, os bombos tinham dado a volta à Vila, a acordar quem ainda mal se deitara. À tarde tocavam outra vez na Praça. Inquietava-me aquele círculo de bombos com um dançarino no centro, a tocar uma flauta do tamanho da sua mão. Ficava estranho, nervoso, sentia um chamamento que nunca compreendi.
Santo Cristo, a veneração maior das gentes da Vila. A procissão unia os pés à cabeça. O andor era levado em ombros pelos soldados regressados da guerra. Toda a gente tinha promessas a cumprir ou pedidos a fazer.
Tamanha santidade pedia manjar especial e por isso as massas do borrego iam a assar ao forno do Sr. José Matias e mais tarde no nosso. Alguns de nós, os mais pequenos, nem íamos à missa, para que ninguém viesse roubar o borrego que ficava no forno, a assar lentamente. O meu pai fartava-se de comer carne assada, mas eu e a minha mãe preferíamos a guisada, que era mais saborosa.
Comíamos borrego no domingo, na segunda-feira e na terça-feira, dia de Nossa Senhora do Carmo. Festas acabadas e, de borrego, nem sobras.



CULINÁRIA

Borrego assado

Ingredientes: sal, pimento, alho, cebola, azeite, vinho e massas do borrego.
Misturam-se o sal, o pimento, o alho, o azeite e o vinho e com eles esfregam-se bem as massas, que se colocam nos tabuleiros de ir ao forno, com os fundos previamente untados e azeite e cobertos de rodelas de cebola. Ficam a temperar algumas horas, pode ser de um dia para o outro, e depois vão ao forno bem aquecido. Assam lentamente.

Borrego guisado
Ingredientes: alho, cebola, vinho, salsa, sal, azeite, louro, pimento e carne das costelas, cortada em pedaços.
Juntam-se todos os ingredientes num tacho e guisa lentamente.

Fressura
Ingredientes: alho, sal, cebola, salsa, vinho, azeite, sangue cozido, fígado, bofe e pâncreas.
Corta-se o bofe e o pâncreas em pedaços e tempera-se com o alho, o sal, a cebola picada, a salsa, azeite e o vinho. Coze-se na caçola, ao lume, com o mínimo de água. Depois de cozido, junta-se o fígado, também cortado aos pedaços, e o sangue cozido, esfarelado, para engrossar o molho. Deixa-se ferver um pouco e está pronto a comer.

Omelete de tubras e miolos
Ingredientes: tubras, miolos, sal, salsa e azeite.
Escaldam-se as tubras, tira-se-lhes a pele e migam-se em pedacinhos. Juntam-se os miolos e ovos batidos, envolve-se tudo, tempera-se com sal e salsa picada e vai a fritar em omelete.

Sopa de massa com carne cozida
Ingredientes: sal, azeite, água, massa e carne com ossos, da cabeça e do pescoço.
Coze-se a carne em água, temperada com os restantes ingredientes, excepto a massa. Depois da carne cozida, tira-se da panela e desossa-se. Em seguida, à água da cozedura, juntam-se a massa e os pedaços da carne cozida. Deixa-se ferver cerca de vinte minutos e está pronta.

Vocabulário (para que as novas gerações nos percebam):
Bofe - Pulmões.
Borreira - Diarreia.
Caçola - Pronúncia local de caçoula; caçarola.
Ceia - Actual jantar.
Fressura - Comida regional, confeccionada com o fígado, os pulmões e o pâncreas do borrego ou do cabrito; o termo também designa o conjunto destes órgãos, quando são retirados do animal.
Jantar - Actual almoço.
Ranchada de filhos - Muitos filhos. Nesta expressão, ranchada é sinónimo de rancho.
Trovisco - Planta arbustiva venenosa, expontânea em Portugal. Utilizado na feitura de vassouras caseiras.
Tubras - Pronúncia local de túberas; testículos do animal (cabrito ou borrego).

(Publicado em: PRATA, José Teodoro – “Instantes saborosos”, Estudos de Castelo Branco, Julho de 2007, Nova Série, N.º 6, Direcção de António Salvado)

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Gosto de figos


Tínhamos 3 figueiras, no leirão da Tapada, em frente à casa. A do fundo era coriga, a do meio, maior que as outras, dava figos brancos pingo de mel e a mais próxima era uma figueira preta. Gostava de todos, mas, embora os figos brancos pingo de mel sejam os melhores, sempre tive um gosto especial pelos corigos, apesar ou talvez por terem aquele gosto selvagem e a casca ser um pouco agressiva à pele da boca.
Também havia uma figueira, na Barroca. Era enorme. Uns ramos cresciam para o alto, outros desciam ao longo da parede até quase ao lameiro. Um dia vi um figo na ponta de uma pernada. Era muito gordo, com mel a sair. Fui avançando e a minha irmã Celeste a convencer-me a desistir. Ia cair! Cheguei à ponta da pernada, estendi a mão, mas, antes de lhe tocar, mergulhei numa floresta de ramos, por onde fui caindo, até bater com a cabeça no chão. Valeu-me ter começado, na véspera, precisamente por aquele canto, a cava do restolho para pôr as couves.
Anos antes, em Setembro de 1967, tinha eu 10 anos, foram os figos que me ajudaram a optar pela vida.
O tempo dera em refrescar e era altura de armar os costis. Eu e os meus primos João e Tó tínhamos só um ou dois por casa, encontrados perdidos nos caminhos e leirões, por quem tinha muitos.
Íamos ao milho, nosso ou de quem fosse, e procurávamos aqueles com sinais de carneiros: um furo, um monte de cocó… Partíamos a cana do milho e escarafunchávamos lá dentro até encontrar o carneiro. Guardavam-se quatro ou cinco numa caixa de fósforos e podíamos ir armar os costis.
A escolha do local exigia saber: um terreno liso, para o pássaro ver facilmente o carneiro, um pouso onde ele pousar e traçava-se a diagonal mais favorável ao olhar do passarinho. Mexia-se a terra, escondia-se lá o costil aberto, com o carneiro preso pelo rabo ao arame da ratoeira. O carneiro ficava a agitar-se e nós íamos armar outro.
Se caía algum, sentíamos orgulho da nossa arte, embora com pena de um pássaro tão bonito que pouco tinha para comermos.
Nesse fim de Setembro, eu e o João tínhamos ido levantar um costil num leirão da primeira horta da Barroca. Olhámos para a encosta do outro lado e vinha a descer a patrulha da Guarda. Já nos tinham visto!
Saltámos para o caminho do rego da água e quase voámos para casa, com os guardas ao nosso encalce pela barreira acima.
Cada um refugiou-se junto da sua mãe. A casa do João era do lado da barreira, por isso os guardas começaram por lá. Ouvi-os a falar e depois apareceram à nossa porta. Perguntaram-me pelos costis, mas eu atirara o meu fora. Foram comigo ao local e lá estava no meio do mato. Voltámos para casa e os guardas ficaram a conversar comigo à entrada da quelha, eles e a minha mãe na ideia de que o assunto ficasse por ali.
Mas eu protestava, dizia que os meus colegas da escola caçavam com 30 e 40 costis e depois disparei para o guarda que falava mais: “O que o senhor quer é levar o meu costil para o seu filho, que já tem mais de 30!”
Ele encostou-me a metralhadora à barriga e ameaçou: “Ou te calas ou nunca mais comes figos daquela figueira!”
Olhei para a arma. Era medonha, com o cano cercado por um mais largo cheio de buracos. Depois virei-me para a figueira. Ele apontara para a nossa figueira branca pingo de mel. Rendi-me. Fiquei calado e os guardas abalaram, quelha abaixo, com o meu costil.