terça-feira, 12 de junho de 2012

De manus

A palavra latina manus deu em português mão e em espanhol mano.
Além de mão, manus também significava, para os romanos, trabalho, obra e indústria.
Foram estes últimos sentidos que deram origem a maneio ou manejo, pois são sinónimos.
Maneio e manejo significam fazer à mão, designam um trabalho manual. Maneio era o termo usado para um imposto relativo a algumas indústrias (as quais no passado eram executadas à mão).
No antigo concelho de São Vicente da Beira, no século XVIII, alguns livros de registo de gados, para fins de cobrança de impostos e de declaração das lãs produzidas designam-se por Maneios.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Maneios

Houve um ano em que andei sempre com o meu pai. Ele recolhia gado desde os lados do Estreito. Quem lho trazia era o tio João da Paiágua que o deixava num compadre do Tripeiro e depois nós íamos lá recolhê-lo. Às vezes era quase de noite e o meu pai não largava a conversa.
“Nunca te preocupes, filho. Aqui, na Charneca, há sempre uma mesa com qualquer coisa para comer e uma cama, se for preciso, nem que seja uma faixa de palha.”

Conduzíamos o gado pelos caminhos, por entre montes alqueivados e matos ralos, em direção ao Sobral e depois à Devesa. Eu seguia à frente no burro, a indicar o caminho. O meu pai vinha atrás, de olho nas reses que se atrasavam, a abocanhar umas ervitas ou as pontas mais tenras dos matos. “Ah chibo dum ladrão! EH! EH!” Se ele não se juntava ao rebanho, o ralho “Ai o alma do diacho!” e o bordão atirado de longe eram suficientes para convencer o mais desentendido.

O gado ficava no casalito, à espera de outro destino. Por vezes trazia malina e começava a morrer passados um ou dois dias. Duma vez, morreram-nos 50 cabeças. Um prejuízo enorme!

Mais tarde, fizemos um bardo para guardar as cabras e os cabritos, no Vale Covo Cimeiro. O António Rodrigues do Monte do Surdo era nosso vizinho. O meu pai e ele trocavam gado, sobretudo os chibos de cobrição. O mesmo com os primos Albanos, criadores de gado e comerciantes como nós. Se o meu pai precisava de reses, mas não tinha as suficientes, eles desenrascavam-no. Outras vezes era ao contrário.

De quinze em quinze dias, fazíamos o mercado da Soalheira, nos domingos. Abalávamos ainda bem de noite e eu deixava-me dormir em cima do burro, deitado na albarda, com os braços em volta do pescoço dele. Se caísse, a alimária parava logo e só voltava a andar comigo novamente em cima. Ao amanhecer, já estávamos a atravessar a Ocreza, um bocado abaixo do Louriçal. Quando chovia, nós passávamos na mesma, desde que desse para o gado atravessar.

Os cães pastores dos rebanhos que havia nos campos apareciam com aquelas coleiras de picos contra os lobos, logo que sentiam o nosso gado. Ladravam, arremetiam, com as bocarras de dentes afiados, mas nós seguíamos em frente, eu no alto do burro e o meu pai de cajado na mão, com as reses coladas a nós, cheias de medo.

Por causa deles é que o meu pai enxotara o nosso cão. “Bobi, casa! Fica a guardar a tua dona.” Ele sentia-se rejeitado e ficava cabisbaixo, mas teimava em seguir-nos mais afastado e então tirava-lhe as ilusões com uma pedrada. Não queria ficar sem ele. Certo dia, o meu pai levou o gado para a Barroca, a comer as folhas que ficaram do milho depois de colher a maçaroca. À ceia, já em casa, deu por falta do cãozito. Também não achava o casaco que usava pendurado no ombro, quando não estava frio. Voltou à fazenda na manhã seguinte e deu com o cão deitado em cima do casaco, no meio do caminho, quase a chegar aos eucaliptos. Só lhe faltava falar!

Mas como eu estava a contar, íamos ao mercado da Soalheira, domingo sim, domingo não. O meu pai matava um cabrito logo que chegava, oferecia um bom presente ao senhor padre e tentava vender o resto. As outras reses eram compradas pelos negociantes que recolhiam gado para Espanha. Às vezes ainda trazíamos carne na volta, porque era tempo de pouco dinheiro. Em nossa casa, de marchante de gado e carniceiro, nunca faltava a carne, o queijo e o soro. Muitas vezes apetecia-nos outras coisas, mas era o que havia e tínhamos de comer.

Nessas ou noutras noites de domingo para segunda, muito antes de clarear, já o meu pai ia a caminho do Fundão, por aquele Arrebentão acima. Com o burro, mas sempre a pé, porque era muito magro e não gostava de andar a cavalo. Levava as reses que lhe tinham encomendado ou que ia tentar vender. Se não fizesse negócio até meio da manhã, já não as vendia. Depois voltava: Souto da Casa, Vale d´Urso, a subida até ao Alto da Portela e depois caminho da Senhora da Orada abaixo.

“Ai é o filho do ti Meguel Jerolme? O seu pai e o meu eram muito amigos.”




Notas:
- Esta é a primeira história de um novo projeto. Sempre o quis realizar, mas as ideias só há pouco me ficaram claras. Já há anos que venho escrevendo sobre a minha família, por isso o narrador fala na primeira pessoa, na tentativa de passar a escrito as histórias que nos aconteceram. Mas a ideia sempre foi escrever as histórias que se contavam ao serão, em volta do porco, nos trabalhos da matação... Este é o meu novo projeto: passar a escrito as nossas histórias orais. Já tenho cerca de 20, mas tenciono escrever muitas mais, sobretudo de pessoas fora da minha família. Quase todas serão contadas na primeira pessoa, sendo o narrador também personagem da história, pois as pessoas contavam (e contam) sobretudo coisas que lhes aconteceram ou que ouviram dos seus familiares. Mas atenção: todas as histórias serão ficionadas, nunca um retrato rigoroso do que aconteceu ou do que me foi contado; aliás, a minha mãe farta-se de protestar que eu escrevo mentiras no blogue.
Alerta: Esta história é contada na primeira pessoa, mas eu não entro nela!

- A história (de vida) agora publicada ensina-nos a forma como os gados eram deslocados desde a zona de criação até ao local de consumo. Neste caso, desde as proximidades do Estreito (Oleiros) até às cidades da raia espanhola. Da Sertã e Proença para Lisboa seria a mesma coisa: os gados passavam pelas mãos de vários produtores/comerciantes até chegarem aos arredores de Lisboa, passadas semanas ou até meses. (Na Idade Média, o rei tinha um curral enorme, chamado uchão, onde guardava os gados vindos de todo o reino, como pagamento de impostos).
Só na segunda metade do século XX é que apareceram os camionetas de transporte de animais e mais tarde ainda os talhos de dimensões industriais, com os seus camiões frigoríficos.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

FORAL MANUELINO – A Ordem de Avis

O nosso foral manuelino, cujo 5.º centenário estamos a comemorar, traz logo no início informação sobre a Ordem de Avis.

Tem a Ordem e Mestrado de Avis na dita vila propriedades de terras e olivais aforadas a pessoas particulares pelos preços e quantias que nos tombos da dita ordem e nos aforamentos das ditas pessoas está declarado, pelos quais até agora se arrecadaram os ditos direitos e arrecadarão daqui em diante sem outra inovação.
E tem mais a dita ordem no termo da dita vila um lugar próprio seu e foreiro de que arrecada seus foros antigos sem contradição, como de coisa sua patrimonial que não jaz debaixo do foral da dita vila. No qual se não pagam outros tributos nem foros senão os que adiante vão declarados. E na maneira e modo como até aqui se arrecadaram os ditos direitos. Mandamos que ao diante se paguem e arrecadem sem nenhuma contradição. Os quais são repartidos igualmente ao meio pela dita ordem e comenda dela e pelo mosteiro de São Jorge de Coimbra. E na dita maneira se fará a dita repartição do rendimento da portagem da dita vila, segundo adiante em seus títulos e capítulos vai declarado.


Desde os alvores da nacionalidade que o território entre a Ocreza e o Tejo fora entregue aos monges guerreiros Templários, mais tarde Ordem de Cristo, mas o concelho de São Vicente, antes pertencente ao território da Covilhã, permaneceu livre de senhorios.
No entanto, outra organização de monges guerreiros, a Ordem de Calatrava, mais tarde de Avis, foi recebendo propriedades e rendas no nosso concelho.
As terras concentravam-se sobretudo na zona sul do concelho, na margem direita da ribeira da Ocreza, tendo como povoados Ceia e Póvoa. Segundo o Engenheiro Manuel Castelo Branco, parte destas propriedades eram a herança pessoal do vicentino D. Fernando Rodrigues de Sequeira que as doou à organização de que foi Mestre, a Ordem de Avis.
Antes desta doação dos inícios do século XV, já as terras do sul do concelho gozavam de relativa autonomia, dada aos moradores pelos anteriores mestres da Ordem. Assim, quer pelo poder autónomo da Ordem de Avis (…como de coisa sua patrimonial que não jaz debaixo do foral da dita vila.), quer pelos privilégios dados aos habitantes deste senhorio, as aldeias de Póvoa de Rio de Moinhos e Ceia (no passado existente na área do paredão da albufeira de Santa Águeda) já se governavam a si próprias, como concelho à parte, neste século XVI.
Esta pertença da Póvoa à Ordem de Avis está testemunhada pela existência do brasão de Calatrava no edifício que terá sido, durante séculos, a casa da Câmara da Póvoa de Rio de Moinhos, situado na Praça desta antiga Vila.
Mas o património da Ordem de Avis não se restringia a estas terras da parte sul do grande concelho medieval de São Vicente da Beira. O nosso foral de 1195 tem como outorgantes os membros da Casa Real e o mosteiro de São Jorge de Coimbra, mas, no século XIV, os rendimentos da Igreja do concelho eram já repartidos pelo mesmo mosteiro e pela Ordem de Avis, o que significa que o rei criara uma comenda com parte dos bens que aqui detinha e a doara à ordem de Avis, ficando ao longo dos séculos esta Comenda da Ordem de Avis com direito a metade das rendas da Igreja e consequentemente com a obrigação de pagar metade das despesas (pagar aos curas e as despesas correntes das igrejas do vigariato). A outra parte cabia ao dito mosteiro de São Jorge, de que se fez depois nova comenda, dada à ordem de Cristo, no tempo do rei D. João II (2.ª metade do século XV).
É esta competência da Ordem de Avis na gestão dos bens religiosos do concelho que explica a presença do brasão da dita Ordem na fachada da Igreja Paroquial do Louriçal do Campo, datada de 1559.

 Póvoa de Rio de Moinhos: à direita, o brasão da Ordem de Calatrava,
em casa particular que no passado foi a casa da Câmara.

Louriçal do Campo: em cima, brasão da ordem de Avis, na fachada da Igreja Matriz.
(bi ne di to porque a ordem se chamava de São Bento de Avis)

domingo, 27 de maio de 2012

Festa da Senhora da Orada

A Senhora tem uma jaja nova!

Em volta da merenda...

 Porta nova no buraco por onde passa a água para a bica.

 Os "Vicentinos" não podiam faltar!

 Dois dedos de conversa, após o almoço.
Uma rancheira com as amigas, antes da função.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Lenda da Portela para a Senhora da Orada

O texto que se segue é da autoria de Luís Antunes e tirei-o do seu site http://bogasdebaixo.blogspot.pt/2009/12/encostas-da-gardunha.html
Mostra-nos a Senhora da Orada vista pelas gentes da vertente norte da Gardunha.
Sendo o site de Bogas de Baixo, não é muito claro a que aldeia se refere o autor, no primeiro parágrafo, pois o caminho apontado era o nosso e não o que, vindo de Bogas, entroncaria neste, na zona do Vale d´Urso. Mas este é um aspeto menor, que não belisca a riqueza do texto.


Uma das mais importantes vias de comunicação existentes na Aldeia até ao segundo terço do último século, era uma breda e nalguns locais já transformada em caminho que ligava o Casal da Serra e a Vila de São Vicente da Beira, ao Fundão, entroncava com o do Vale d´Urso, passando pelo Casal de Álvaro Pires, sítio da Vila Ribeira d´Alva, sítio da Vila Nova do Ocaia e o próprio Souto da Casa. Esta mesma via era muito utilizada pelos devotos da Senhora da Orada, aquando das Festas realizadas em Seu Louvor, e que residiam do lado de cá da Serra.
Ao alto do caminho que faz a transição natural da encosta de cá para a de lá, chamam-lhe há muito, a Portela. Sem dúvida que estamos em presença de mais um dos locais incomparavelmente belos e admiráveis da nossa Serra. Dali, consegue-se perceber o contraste entre uma paisagem dourada e quente, de transição para o Alentejo, do lado de Castelo Branco, e uma outra, serrana, acidentada, verde e fria para o lado do Souto da Casa. Era ali que alguém, em dia de festa à Senhora da Ourada, montava estrategicamente uma tasca de ocasião, cuja oferta aos forasteiros rendia alguns réis e vinténs no final do dia.
A lenda deste local prende-se com a calçada romana ali existente. De visita ao local, alguém de muito mais idade nos informou de que aquela calçada tinha sido feita pelo diabo numa noite. Perplexos e curiosos perguntámos o porquê de tal afirmação, ao que nos respondeu:
"Vocês que são gente de estudos, por certo já ouviram falar no Veriato!"
Perante a nossa estupefação, por não estarmos preparados para tal questão, retorquiu:
"Então nunca ouviram falar num valente homem que por aqui andava a distribuir porrada nos romanos?"
Aí, participando no seu raciocínio, indicámos que na verdade já tínhamos ouvido falar num Viriato, mas que andava bem longe destas paragens…
"Ai sim?
Então andava longe?
Fiquem então sabendo que foi por causa dele que os romanos nunca conseguiram passar do lado de lá, da Senhora da Orada, para o nosso lado!"
Notava-se perfeitamente no rosto queimado pelo sol de um sem número de Primaveras, envelhecido pela rudeza da vida e a dureza do trabalho do campo, a alegria de estar a ser ouvido e talvez compreendido. Sim, porque naturalmente lhe interessava mais que alguém o ouvisse do que o compreendesse. Isso pouco importava…
Os seus olhos negros e vivos irradiavam sabedoria e muito conhecimento, mas também orgulho sincero por ser dos do lado de cá!
"Foi então que não conseguindo levar a melhor com o tal Veriato, pela calada da noite, meteram mãos à obra e conseguiram fazer esta calçada até à Portela. Mas não passaram daqui, quando não…levavam poucas!"
Enquanto contava isto, pegava num dos extremos do cajado que lhe servia também de apoio às suas já débeis pernas e com uma força incontida ameaçava ainda hoje, no imaginário, "os do lado de lá".
"Percebem agora porque se diz que foi feita pelo diabo numa noite?"
Afinal o diabo toma a figura que lhe quisermos dar. Mas esta, por hábito, nunca passou de má, sinistra, inimiga, odiosa e sobretudo, a evitar! À margem desta lenda, como justificação ou não, para a sua existência, constatamos a veracidade dos seguintes factos:
- A calçada romana existe realmente na Portela;
- o Museu da Vila de São Vicente da Beira expõe imensos achados romanos nas suas vitrinas;
- bem perto, existem calçadas romanas em Alcongosta, Alpedrinha e Castelo Novo;
- é verdade que "para o lado de cá", a encosta Norte, a mais "guardada" da Gardunha, não existe qualquer calçada romana e desconhecemos achados romanos de interesse superior ou em quantidade a registar;
- também nos ensinaram que Viriato estendia a sua ação bélica de guerrilha impeditiva do avanço dos romanos, para cá dos Montes Hermínios.



Calçada entre a ermida da Senhora da Orada e o Rabaçal

segunda-feira, 21 de maio de 2012

5.ª FEIRA DE ASCENSÃO


JOSÉ BARROSO


Hoje é 5.ª feira de ascensão; não vi no calendário; mas esta manhã disseram-me que era 5.ª feira de ascensão; já me tinha esquecido; em tempos, terá sido feriado; quando eu era criança era apenas um dia de tolerância ao trabalho; pelo menos no campo; e íamos todos à missa.

Para muitos é o dia da espiga.
Mas eu sempre conheci este dia, como a 5.ª feira de ascensão; o dia em que Jesus Cristo subiu (ascendeu) ao céu em corpo e alma, após 40 dias na terra, depois da ressurreição.
A 5ª feira de ascensão é assim e pronto!! Para que precisava o imaginário dos simples das complicadas explicações da teologia??

Lembro-me de os rapazes mais velhos, na véspera de 5.ª feira de ascensão irem, à noite, pela calada, apanhar as andorinhas nos seus ninhos; fosse nas minas, nos beirais ou noutros locais onde elas nidificavam; as andorinhas não fazem os ninhos como a maioria das outras aves; com pequenos ramos e raízes entrelaçadas, forrados depois com penugem, pedacinhos de lã ou outros materiais macios que encontram pelos campos; fazem-nos com lama amassada com os bicos; depois de secos é que os aconchegam, introduzindo-lhes, então, um fofo recheio.

Chamávamos às andorinhas «as galinhas de Nossa Senhora»; na 5.ª feira de ascensão, de manhã, deitavam-nas no interior da igreja, onde elas permaneciam durante a missa desse dia, a esvoaçar, às voltas, um pouco tontas; quando se cansavam de andar às voltas, porque o espaço era exíguo, pousavam numa das estruturas de metal existentes junto ao tecto, onde se pendurava o petromax para iluminar a igreja; nessa altura ainda não havia electricidade na vila; na casa dos meus avós paternos ainda se usavam candeias de azeite com torcida de linho enrolado; já estavam vulgarizados os candeeiros a petróleo, mas para os utilizar era necessário comprar a torcida e o combustível; era preferível usar o azeite que, felizmente, abundava.

E eu preocupava-me sempre com aquelas andorinhas, porque havia um grande respeito por elas; é bem, sabido que não caíam nos costis ou noutras armadilhas, porque são aves urbanas; mas isso também não interessava porque nós nunca as podíamos apanhar; e por isso também não as podíamos comer, como os outros pássaros, assados ou fritos; só podiam ser apanhadas para o dia de 5.ª feira de ascensão para serem deitadas na igreja; tinham muita sorte por serem «as galinhas de Nossa Senhora»; e não me consta que alguma vez tenha morrido alguma andorinha, nas primaveras de todos aqueles anos, pelo facto de serem lançadas na igreja na 5ª feira de ascensão; é que, fosse nesse dia ou no dia seguinte, encontravam sempre uma saída para regressar à liberdade.

Na 5ª. feira de ascensão, também se deitavam rosas na igreja; muitos ofereciam-nas e os voluntários iam apanhá-las nos quintais; e isso tinha que ser feito nessa manhã, antes da missa, para que, entretanto, não murchassem; desfolhavam-nas; enchiam vários açafates grandes com as pétalas das rosas desfolhadas; elas eram de várias cores: brancas, cor de rosa, amarelas, vermelhas; mas, parece-me que predominavam as vermelhas; a determinada altura da cerimónia, o senhor António Maria, ia pela coxia da igreja abaixo e atirava, para um e outro lado, alternadamente, punhados de pétalas de rosas para cima das pessoas que assistiam à missa; muitas ficavam, por momentos, com pétalas de rosas na cabeça e nos ombros, mas a maior parte caía no chão; o senhor Vigário vinha também a aspergir água benta.
No fim, o chão ficava juncado de pétalas de rosas salpicadas de água benta; mas as pessoas regressavam a suas casas limpas de espírito e revigoradas, para encararem a vida com outro ânimo; havia agora que mobilizar os voluntários para a limpeza da igreja, porque a solenidade do dia tinha terminado; e esperava-se já o dia de 5.ª feira de ascensão do ano seguinte.

Uma vez, na 5ª feira de ascensão não fui à missa!! O trabalho que tive para iludir a minha mãe!!

Mas a razão era de monta. Tratava-se de presenciar um milagre!! Sim, um milagre!! E não era todos os dias que podia presenciar-se um milagre!! Na verdade, tinham-me dito que, ao meio dia, durante a missa, no momento da «Consagração» ou do «Glória», as folhas das oliveiras se cruzavam todas entre si, à passagem de Nosso Senhor, que subia ao céu!! Por isso, em vez de ir à missa, esperei que a minha mãe saísse para a igreja e fui, sorrateiramente, para o meu quintal, o Chão da Capela, a fim de surpreender o fenómeno; subi a uma oliveira; estive lá o tempo todo em que decorreu a missa, cerca de 1 hora. Olhei, voltei a olhar para as folhas da oliveira, mas pareceu-me nada ter visto!! E já vinha descendo da árvore, desiludido.

Depois, observei melhor e vi!! Vi, sim senhor!! Milhares de folhas de oliveira cruzadas com milhares de outras folhas de oliveira!! Milagre!! Milagre!! Milagre!!
Hoje sei e penso: «é claro que tudo se ficou a dever, apenas, à disposição natural das folhas na árvore»; «muitas folhas da oliveira estavam, naturalmente, cruzadas entre si»; «pois com certeza»; «nada daquilo teve a ver com qualquer milagre»!!

Mas que importância tinha isso??!! Importante era o meu imaginário; e esse continuou intocável;
Por isso quero acreditar que ainda hoje se diga às crianças: «as folhas das oliveiras cruzam-se todas ao meio dia de 5.ª feira de ascensão, durante a missa, no momento em que Nosso Senhor sobe ao céu » !!

Coimbra, 5ª feira de ascensão, 17 de Maio de 2012.

(Uso a ortografia anterior ao actual Acordo).

sábado, 19 de maio de 2012

A ti Janja na TVI

A ti Janja aparece no minuto 25.10.
É no ecrã maior, à esquerda. Esperar que passe a publicidade.
Obrigado à Sara Varanda.

 http://www.tvi.iol.pt/videos/13629494