Acabei de ler este livro que tem dois aspetos relativos a
nosso património local já aqui referidos.
O primeiro diz respeito ao nosso hábito antigo de os irmãos
mais velhos serem padrinhos de batismo dos mais novos. Uma das razões será o comodismo
da situação: não ter de ir pedir “favores” a ninguém e ainda ter a vantagem de
ser a própria família a escolher o nome da criança. Mas este hábito ancestral poderá
ter ainda outra origem, já perdida na nossa memória coletiva (ou talvez não).
O livro refere, nas páginas 99 e 100, a propósito de lendas e
crenças relativas à interação entre humanos e lobos:
«…Na zona de Bragança, o povo crê que o lobisomem é o
resultado de uma relação pecaminosa entre padrinho e afilhada. Ainda na raia,
mas na Beira Baixa, as gentes culpavam os padres. Bastava que o pároco se
confundisse com as fórmulas do batismo para condenar a criança a este negro
fado. Nas aldeias de Pitões das Júnias, em Riba de Mouro ou em Parada do Outeiro,
o lobisomem seria o sétimo filho varão de um casamento. E a única forma de
quebrar a maldição era a criança ser batizada pela mão do seu irmão mais velho.
Apesar de menos
frequente, o malefício também acontecia às irmãs. O investigador Leite de Vasconcelos,
no Tomo II da sua Etnografia Portuguesa, recolheu testemunhos no Minho que se
referiam às lobeiras ou peeiras. «E quando se perguntava ao povo o que
significa “peeira”, ele responde: a que vive ao pé dos lobos», conta o
investigador. Esse fenómeno, segundo a tradição popular, era semelhante ao dos
rapazes: quando nasciam sete raparigas numa mesma casa, a mais nova acabaria
lobeira. Isso só seria evitado se a irmã mais velha aceitasse ser madrinha de
batismo da mais nova.»
O segundo aspeto diz respeito aos cavalos. No meu livro “O concelho
de S. Vicente da Beira na Guerra Peninsular” dei notícia da entrega aos
franceses, logo no início da 1.ª invasão, de um cavalo de lista, por João Leitão,
de Tinalhas.
Em publicação posterior, aqui no blogue, referia a existência
em Portugal de antigos cavalos listados ou zebrados, espécie ainda
sobrevivente através do cavalo Sorraia, de que restam poucos exemplares.
Sorraia é um
tipo de cavalo de
origem portuguesa,
redescoberta em 1920 por
Ruy d'Andrade e cujos indícios remetem para a zona de confluência entre as
ribeiras de Sor e da Raia (daí
o seu nome), charneca de Coruche, onde haveria uma extensa população, popular entre
criadores de gado para trabalhos do campo. Admite-se que estes cavalos no
estado selvagem tenham sido conhecidos em Portugal por "zebro".
Continuar a
ler em: https://www.wikiwand.com/pt/Sorraia
O livro “Feras e Homens” fala da caça ao zebro, na época
medieval, um cavalo selvagem então muito abundante do nosso país. E conta que
os portugueses, nos séculos XV e XVI, ao verem em África um animal também
listado como o zebro, lhe chamaram zebra, nome e grafia por que passou a ser
designado em todo o mundo.
José Teodoro Prata