sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Reforma da Administração Local

O Governo apresentou, no passado dia 26 de Setembro, o Documento Verde da Reforma Administrativa Local.
Por acordo com a troika, em meados do próximo ano devem estar lançadas as bases desta reforma e publicada a legislação de suporte.
O jornal Gazeta do Interior, de C. Branco, traz esta semana artigo de fundo sobre o tema.

Algumas questões:

- Confirmaram-se os meus receios: incentiva-se a fusão de municípios, mas a extinção de freguesias é a prioridade. Pudera, é nos concelhos e em volta das câmaras que gravitam as elites partidárias locais, no poder agora ou daqui a uns anos. Afrontá-las seria criar fracturas nos partidos, comprometendo apoios às direções nacionais!

- Na reforma administrativa que extinguiu o concelho de S. Vicente da Beira, em 1895, salvaram-se os concelhos minúsculos de Vila de Rei, Vila Velha de Ródão, Penamacor e Belmonte. Alguns chegaram mesmo a ser extintos, mas restauraram-se de novo, só pelo de S. Vicente ninguém acudiu, como se lamentava Hipólito Raposo. Agora, cem anos depois, preparam-se para continuar a sobreviver. Pelo menos o de Vila de Rei não será tocado, pelo peso que tem dentro do partido do Governo.

- No artigo da Gazeta, vários autarcas da região defendem que, em vez de extinguir freguesias isoladas, a prioridade devia ser extinguir as freguesias das sedes dos concelhos, que não servem para nada, pois aí são as câmaras que fazem tudo. Nas sedes dos concelhos, apenas no século XIX foram criadas as Juntas da Paróquia, nos séculos anteriores eram as câmaras a cuidar dos assuntos das sedes concelhias. Sem esta medida e sem a extinção dos concelhos pequenos, não vejo onde se vá poupar alguma coisa, sendo esse o principal objectivo desta reforma.

- O critério será, segundo o documento, extinguir freguesias com menos de 500 habitantes. No nosso concelho, estão nesta situação o Sobral do Campo, Ninho do Açor, Freixial do Campo, Juncal do Campo, Cafede, Monforte da Beira e Mata. São Vicente da Beira, com 1261 habitantes (Censo de 2011), é a quarta freguesia mais populosa do concelho e também uma das maiores em área geográfica. A lei não a obrigará a alterações.



- Em princípio, não sou um partidário cego das freguesias atuais. Muitas vezes, elas dividem os povos mais do que os unem. Por exemplo, Cebolais de Cima e Retaxo são duas freguesias do mesmo concelho, encostadas uma à outra, por uma rua que nem sei a qual pertence. Juncal e Freixial, quase igual. Cafede é uma minúscula aldeia ao lado de C. Branco, quase um mini dormitório. Dos tempos antigos, perdemos a solidariedade, a partilha, a união. São valores a renovar nesta reforma. Associação generalizada de freguesias pequenas e/ou contíguas, independentemente do número de habitantes, porque não? (Mas não percebo onde se consiga poupar dinheiro que se veja!)

- Mas temo por este extingue-se e depois logo se vê. Não vai haver tempo para as ideias amadurecerem, fazendo germinar novas realidades, novas práticas de vida comunitária. O que está em risco de morrer é nada menos que a democracia local, a proximidade com as pessoas, a participação das comunidades na resolução dos seus problemas. Claro que não é a associação de freguesias, só por si, que implicará esse risco, mas sim as soluções apressadas. Há uns tempos conheci um ditado que retrata esta ideia: cadelas apressadas parem cachorros mortos. Estamos a esquecer-nos demasiado das pessoas: a lógica atual é a precaridade e o desemprego, porque se poupa; fechar serviços, porque se poupa; diminuir os transplantes, com a consequente morte dos pacientes, porque se poupa… Cresce um sentimento generalizado de abandono, entre as gentes.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O nosso falar: trogalho

É um trogalho, trogalhão ou trogalheiro quem se engana frequentemente naquilo que quer dizer. Troca tudo, mete os pés pelas mãos.
O dicionário informa-me que um trogalho é uma pequena corda para servir de atilho. Não foi por aqui que os nossos antepassados qualificaram quem diz trogalhices.
Trogalho significa também uma pessoa desajeitada. Mais não diz o dicionário e por isso ficamos sem saber se esta falta de jeito se aplica a tudo ou só ao falar, como na nossa freguesia.
Chamar a alguém trogalhão ou trogalheiro é uma forma carinhosa de se referir às suas dificuldades em se expressar pela fala. Normalmente, aplica-se às crianças e aos idosos, pessoas em quem a trogalhice é natural. Mas, por uma questão de respeito, raramente a usamos em relação a alguém que diz trogalhices por motivos de saúde.

sábado, 1 de outubro de 2011

Os eleitores de 1838

Em Outubro de 1838, a Junta da Paróquia reuniu, sob presidência de José Hipólito, estando presentes ainda João Duarte Marques (Regedor), João Agostinho, Gregório Lopes e Jacinto Nunes.
A ordem de trabalhos era o recenseamento dos eleitores da freguesia, a fim de votarem nas eleições municipais.
Segundo a legislação da época, só podiam votar os homens maiores de 25 anos, com posses para sustentar a família. Era o voto censitário, reservado aos mais ricos (com o mínimo de 100$000 réis de rendimento anual).
Considerando a população da freguesia, anos antes, no Censo de 1801 (323 fogos e 1397 habitantes), os 82 eleitores recenseados representam 25% dos chefes de família. Em média, por cada 4 famílias(fogos), o chefe de uma delas tinha direito a votar nas eleições.

Eleitores da freguesia de S. Vicente da Beira, em 1838

Vila
Francisco António Leitão
António Leitão
Manuel Duarte Durão
José Henriques Sénior
Francisco Vaz Raposo
Joaquim Duarte
António Ferreira de Carvalho
Bernardo António Robles
Manuel de Oliveira
O Reverendo Padre Joaquim Marques
Manuel Simão
João Agostinho
Caetano José dos Santos
António Roiz(Rodrigues) Castanheira
João Duarte Marques
Joaquim Se.(?) Gonçalves
Francisco Cardoso de Almeida
João Duarte Neto
O Reverendo Vigário Manuel Marques Leite
Francisco Duarte Lobo
João Robalo da Cunha
O Doutor José Maria de Moura
José Hipólito
Gregório Lopes
Joaquim Nunes
Bonifácio José de Brito Coelho de Faria
Francisco Rodrigues Lobo
Francisco Cardoso
João Duarte Remoaldo
Jacinto Nunes
Francisco Henriques
João dos Santos Vaz Raposo
O Reverendo Padre João António Ribeiro
Domingos da S.ª(Santa?)
João de Mesquita

Pereiros
João de Oliveira
António Fernandes Pedro
José António
Manuel Roiz(Rodrigues)

Paradanta
Manuel Leitão
João Mendes

Partida
Manuel Martins Dâmaso(?)
António Fernandes Varanda
João Fernandes Pedro
Manuel Martins Pedro
José João
João da Costa
António Martins
José Freire

Vale de Figueiras
João Martins
Manuel Francisco
Domingos Vicente
José Rodrigues

Violeiro
Francisco Vaz da do meio
José Fernandes Sapateiro(?)

Mourelo
Manuel Leitão Matias
João Faustino
Francisco Varanda
João Miguel
Manuel António
João Diabinho
Manuel Roiz(Rodrigues) Bartolomeu
José Varanda
João Francisco Diabinho

Tripeiro
João Ribeiro Garrido
José Martins
Paulo Lourenço
Francisco Valentim
Francisco Afonso
João Ramalho
Joaquim Francisco Magueijo
Francisco José de lopio(Lopo?)
José Lourenço Sénior
Francisco Ramos
João Marcelino

Casal da Serra
Francisco Rolão
Manuel Freire
José Cruz
Manuel Cruz
Joaquim Cruz
José Caetano
Joaquim Martins

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Uma sede para a banda


Com 100 anos, a Filarmónica Vicentina já merece uma casa sua. A Direcção e a Câmara Municipal estão a tratar disso.
O local é um dos mais bonitos da Vila: a casa e quintal que foi de João Coxo, junto à Fonte Velha, e uma outra casa encostada, a dar para a Rua Dona Úrsula.
A nossa banda ganha uma sede e requalifica-se aquele espaço, já em ruínas.
Só falta a casa da família Cunha e o largo da fonte ficará um brinquinho!

terça-feira, 27 de setembro de 2011

O nosso falar: malina

A palavra tem outros significados, mas, nos sentidos que lhe damos, é o mesmo que maligna.
No referente à saúde das pessoas, a palavra malina designa uma doença contagiosa, como uma gripe, mas tem sobretudo o sentido de algo ruim, incurável.
Nas plantas, aplica-se a doenças como o oídio (cinza) e o apodrecimento dos gachos ou a cinza e os piolhos nos feijoeiros. Como viram em recente comentário do Ernesto Hipólito, a vindima este ano foi fraca, porque deu a malina dos gachos.
Conheço um agricultor de fim de semana que se iludiu com o bom tempo do ano passado, não tratou as videiras, nesta primavera, e agora restam-lhe as uvas morangueiras. E viva a festa!
Mas malina também pode usar-se para apreciar o carácter de uma pessoa. Uma mulher malina é maldosa, mal-intencionada, gosta de fazer mal. No masculino, a mesma coisa e ainda sinónimo de diabo. Ele que não existe no feminino, talvez porque, quando foi criado, as mulheres não eram suficientemente importantes para serem dignas da maldade de que ele é capaz.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

A côngrua de 1836

A Junta da Paróquia reuniu, no dia 9 de Outubro de 1836, a fim de «…arbiterar ao Reverendo Parrocho desta Freguesia huma congrua decente e razoável, conforme o seo trabalho e as posses dos Fregueses…».
A ordem vinha do poder central, via Câmara Municipal, acompanhada de cópia do decreto de 19 de Setembro.
O que sendo tomado em consideração «…com toda a madureza, que o objecto demanda, acordou a Junta que em atenção áo trabalho, que o Reverendo Parrocho tem na Administração dos Sacramentos por ser esta Freguezia numerosa e constar de Povos dispersos, que a Congroa annual fosse arbiterada na quantia de duzentos mil reis em dinheiro não só por que nesta quantia veria a emportar a sua congroa antiga, que as Comendas lhe pagavaõ em géneros, mas (…) naõ devia parcer excessiva tendo consideraçaõ á grandeza da Freguezia.»

Há séculos que as comendas de Avis e de Cristo beneficiavam dos rendimentos da Igreja, no concelho, e por isso pagavam as suas despesas. Em 1758, Ordem de Cristo pagava ao Vigário 17500 réis em dinheiro, 4000 réis em casas de aposentadoria, 300 alqueires de pão meados trigo e centeio, 40 almudes de vinho em mosto, 7,5 alqueires de azeite e metade do pé de altar; a Ordem de Avis pagava-lhe 14000 réis e metade do pé de altar.
Mas a revolução liberal de 1820, confirmada pela vitória dos liberais na guerra civil de 1828-34, acabou com essa realidade, ditando novas regras, que aqui dou a conhecer.

O mesmo decreto mandava «…arbiterar áo cobrador huma cota razoável pelo seo trabalho…» e por isso acrescentou-se a quantia de seis mil reis, «…que vinham a ser dois e meio por cento como se costuma dar aos recebedores da fazenda Publica.»
E era necessário ordenado para o sacristão «…que ajude o Parrocho no serviço da Igreja…» . Como a Junta não tinha dinheiro para lhe pagar, decidiu-se cobrar mais cinco mil e setecentos e sessenta réis.
Côngrua para o pároco + ordenado do sacristão + pagamento ao cobrador = duzentos e onze mil, setencentos e sessenta réis. Esta quantia devia ser derramada (dividida) pelos fregueses.
No dia 1 de Janeiro do ano seguinte, o rol (lista) dos chefes de família da freguesia já estava pronto e por isso se decidiu cobrar a côngrua, imediatamente, sendo nomeado, para cobrador, João Duarte Marques.

sábado, 17 de setembro de 2011

O nosso falar: gacho


Gacho de moscatel branco.

Com as vindimas quase no fim, há que recordar a palavra gacho. Este ano os gachos estavam fracos. A humidade primaveril favoreceu o aparecimento de doenças, sobretudo do oídio.
Andei toda a semana a pensar esta palavra, que não existe com o sentido que lhe damos. Gacho é a parte posterior do pescoço do boi, em que assenta a canga, o cachaço. Também se usa para designar uma pessoa baixa, atarracada.
Na quinta-feria, fez-se-me luz: gacho é a nossa maneira de dizer cacho. O nosso povo dizia cacho sem abrir suficientemente a boca e por isso os mais novos, ao aprenderem a palavra, percebiam gacho e assim ficavam a dizer.
Abrir a boca para dizer cacho era (é) uma trabalheira!
Cacho é um conjunto de flores ou frutos sustentados por pedúnculos. Exemplo: cacho de uvas. Cada bago é uma uva e o conjunto das uvas forma um cacho de uvas.
Na minha infância, nem sequer conhecia a palavra uva. Só dizia gacho. Agora quase desapareceu, já ninguém a usa.


Estes gachos são de morangueiro branco. São docinhos e não há malina que entre com eles.