Em setembro de 2012, quando escrevi e aqui publiquei o texto “Coisas do diabo”, ignorava que a perturbação mental do ti Hipólito era afinal um trauma de guerra, como logo na altura uma sua familiar me informou em comentário ao texto. Depois, aquando da investigação para o livro “Os combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra” fui sabendo coisas novas e é justo que agora aqui deixe mais informações sobre o que foi esta expedição a Moçambique, na qual participou Hipólito dos Santos Nascimento, possivelmente como soldado do 7.º grupo de metralhadoras de Castelo Branco ou de artilharia de montanha (regimento de Évora ?). Em Penamacor existe um monumento com os nomes de dezenas de militares mortos nesta 2.ª expedição a Moçambique.
A 23 de Agosto 1915 foi decretada uma segunda expedição a Moçambique. Tal como
a primeira expedição, esta nova força enfrentou as mesmas dificuldades que a
anterior, isto é, foi preparada à pressa, razão pela qual levou a mobilização
do pessoal doente. Estas doenças não eram incapacitantes, mas dificultavam a
adaptação dos soldados ao clima de Moçambique, associado a isto estava a má
preparação das praças que fazia com que muitos destes fossem punidos por razões
disciplinares. Os serviços de saúde eram inadequados, os medicamentos e os
géneros alimentícios eram insuficientes, não só por causa da má preparação da
expedição, mas também, devido ao facto de muitos géneros estarem deteriorados à
chegada
Esta 2.ª
Força Expedicionária de Moçambique era formada por:
- 3.º
Batalhão do Regimento de Infantaria n.º 21 (Penamacor)
- 2.ª Bataria do 7º Grupo de Metralhadoras
(Castelo Branco)
- 5.ª Bataria do Regimento de Artilharia de
Montanha (Évora)
- 4.º
Esquadrão do Regimento de Cavalaria n.º 3 (Estremoz)
- Tropas
de Engenharia - Serviço de Saúde - Administração Militar
(41 oficiais, 1.502 praças).
A expedição chegou Porto Amélia (Moçambique) a 7 de novembro de 1915. O comandante da expedição Major José Luís de Moura Mendes nunca tinha servido nas colónias e a sua nomeação estava mais ligada aos seus contactos políticos no Governo da República, do que ligado à sua capacidade militar. As suas ordens eram para defender a fronteira do rio Rovuma e criar uma rede de postos de observação ao longo do rio desde o Oceano Índico até ao afluente rio Lujenda.
O Major Moura Mendes ignorou os avisos do
comandante da 1.ª Força Expedicionária, quando o avisou do que o Governo de
Lisboa lhe estava a pedir e que deveria resolver rapidamente o problema do
aquartelamento das tropas no Porto Amélia. Manteve o Quartel-general perto do
porto, numa zona insalubre, e por falta de hábitos de higiene das tropas
aquarteladas, rapidamente apareceram doenças que também se tornaram epidémicas
e atingiram quase todos os expedicionários. Os militares mantiveram-se dentro
das fronteiras da colónia portuguesa numa posição defensiva, tendo passado o
ano de 1915 sem qualquer contacto com as forças alemãs.
A 9 de Março de 1916
a Alemanha declarou guerra a Portugal e o Governador Geral de Moçambique,
Álvaro de Castro, retoma novamente o objetivo de reocupar o Quionga, de invadir
a colónia alemã até ao rio Rufigi e de colaborar com as tropas britânicas.
Em fins de março organizou-se em Porto
Amélia um pequeno destacamento, sob o comando do Major Portugal da Silveira,
com uma companhia do Regimento de Infantaria n.º 21, uma bateria de artilharia
de montanha (m/82) e um pelotão de cavalaria, tendo por fim ocupar Quionga e
fazer um reconhecimento ofensivo na direção de Mikindani, Lindi. O destacamento
foi transportado, em princípios de abril, no vapor "Luabo", até
Palma, onde incorporou forças indígenas. O Major Portugal da Silveira marchou
ao longo do litoral de Palma até Quionga, cerca de 12 quilómetros, com as
referidas forças e uma companhia indígena, ocupando, a 10 de abril de 1916, a
localidade que se encontrava abandonada pelos alemães, deixando, no entanto,
algumas trincheiras construídas. A 23 de Abril as restantes forças
expedicionárias foram transportadas a bordo do vapor "Limbo" de Porto
Amélia para Palma.
De seguida procedeu-se à ocupação de todos
os postos militares alemães que se encontravam na margem direita do rio Rovuma:
Namaca, Namiranga, Namôto, Nachinamoca e
Nhica, os quais passavam a ser a base defensiva da colónia, numa linha que se
estendia por 50 km desde a foz do rio. Em frente na margem esquerda do rio
ficavam os postos militares alemães de Fábrica, Migomba, M'chinga, Marunga e
Tchidia.
A 23 de abril os alemães iniciaram
incursões militares para recuperar o Quionga, através de ataques sucessivos aos
postos militares portugueses, mas que não tiveram êxito. Os alemães abriram
fogo de metralhadora sobre o posto de Namôto e o pelotão de praças indígenas
(landins) e os graduados europeus fugiram para Quionga. O pelotão foi
reorganizado e enquadrado por outros graduados que contra-atacaram e
recuperaram o posto de Namôto.
A 19 de maio chegou à foz do rio Rovuma o
Cruzador "NRP Adamastor" e a Canhoneira "NRP Chaimite" que
colaboraram ativamente com as forças expedicionárias. Uma pequena força de
marinha desembarcou junto do posto alemão Fábrica e incendiou tudo quanto era
combustível, palhotas e cercados, sem que o inimigo disparasse um tiro.
A 23, tentou a marinha, com as suas
lanchas, novo desembarque no mesmo posto, mas foi alvejada pelas metralhadoras
alemãs, pelo que teve de retirar com três mortos e seis feridos. Foi então
resolvido tentar-se a passagem do Rovuma, em força e assim a 27 de maio,
forçou-se a passagem, sob o comando do Major Moura Mendes, assistindo o
Governador Geral Álvaro de Castro de bordo do cruzador Adamastor. Foi um ataque
coordenado entre forças da marinha que tinham por missão um desembarque e
forças do exército que tinham por missão atravessar o rio mais a montante. O
ataque foi repelido pelos alemães após várias horas de combate, tendo-se
verificado 3 oficiais e 30 praças mortos, 4 oficiais e 20 praças feridos e 2
oficiais e 6 praças prisioneiros. Representou um grande esforço, bem executado,
mas malsucedido.
Este insucesso paralisou a 2.ª expedição
durante quatro meses e inutilizou a sua ação ofensiva, mantendo-se, contudo, a
reocupação da margem sul do Rovuma. Verificaram-se numerosas ações neste
período, tendo esses pequenos combates o mesmo aspeto do ataque alemão ao nosso
posto de Maziúa.
Pequenas forças alemãs vinham atacar os
nossos postos desde o Oceano Índico até ao Lado Niassa e com fortuna vária
terminavam os assaltos, que não podiam ter continuidade em vista do isolamento
dos postos, mas conseguiam do lado alemão manter o espírito ofensivo, enquanto
do nosso lado nos enervavam fazendo-nos enfraquecer o espírito combativo.
Texto elaborado a partir de informação tirada dos sites:
https://www.momentosdehistoria.com/MH_05_02_Exercito.htm
https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/14690.pdf
José Teodoro Prata
Um comentário:
Felizmente que nesse monumento de Penamacor não consta nenhum Sanvicentino morto em Moçambique, mas muitos trouxeram problemas de saúde que lhes condicionaram o resto das vidas de forma muito marcante.
É arrepiante a pintura de José Joaquim Ramos (Tropas de África), exposta no Museu Militar, que mostra como foi penosa a participação dos nossos militares na G. G. em Angola e Moçambique, não tanto pelos confrontos militares com os alemães, mas sobretudo pelas dificuldades de toda a ordem que tiveram que enfrentar: o clima, as doenças, a fome e a sede, as más condições de aquartelamento e transporte, etc. que mataram mais do que as armas.
Como dizia um dos nossos militares: “As guerras são a pior coisa que há no mundo.” Ainda hoje…
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