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terça-feira, 13 de outubro de 2020

Os Sanvicentinos na Grande Guerra

Francisco Candeias



Francisco Candeias nasceu em São Vicente da Beira, no dia 17 de agosto de 1892. Era filho de José Candeias e Rosário Castanheira, natural do Souto da Casa.

Assentou praça em 12 de julho de 1912, e ficou pronto da recruta em 30 e março de 1913. Passou à formação permanente, em virtude de sorteio, sendo incorporado no Regimento de Artilharia de Montanha de Portalegre, segundo o filho José Candeias. Na altura era jornaleiro e analfabeto.

Foi destacado para integrar a 1.ª Expedição enviada para a província de Angola, a fim de reforçar a força militar que já se encontrava naquele território, ameaçado pelas tentativas de ocupação alemã. Embarcou em 10 de setembro de 1914 e chegou ao porto de Moçâmedes, no dia 1 de outubro, seguindo depois para a região do Cunene.

De acordo com a sua folha de matrícula, participou na ação do dia 18 de dezembro, contra os alemães, fazendo parte das tropas que ocuparam o vau de Calueque. Pertencia ao destacamento que reconquistou e ocupou o Cuamato, de 12 a 27 de agosto, tendo tomado parte também na ação do Ancongo, em 13 de agosto de 1915, e no combate da Inhoca, em 15 do mesmo mês, dia em que o destacamento entrou no Forte de Cuamato. Com o mesmo destacamento, avançou em 20 de agosto sobre Cunhamano, a fim de restabelecerem as comunicações que haviam sido cortadas pelos alemães. No dia 24, participou no combate da Chana da Mula. Embarcou de regresso à Metrópole, no dia 16 de novembro de 1915, e chegou a Lisboa a 5 de dezembro.

Foi novamente mobilizado, em 27 de abril de 1916, para integrar a 3.ª Expedição que partiu para Moçambique. A este propósito, contava que um dia foi plantar oliveiras para a Tapada e, por volta do meio-dia, viu chegar um dos irmãos a correr. Ficou todo contente, porque já estava com fome e pensou que lhe trazia a merenda, mas o que ele trazia na mão era uma carta com ordem para se apresentar no quartel.

Embarcou no dia 24 de junho e chegou ao porto de Palma, no norte de Moçambique, em 24 de julho. Não se sabe exatamente qual foi a sua participação na guerra, mas terá estado envolvido nas tentativas levadas a cabo pelas tropas portuguesas para ultrapassar o rio Cunene para norte e conquistar territórios ocupadas pelos alemães.

Embarcou, de regresso à Metrópole, no dia 23 de dezembro de 1917, regressando a São Vicente da Beira. Passou à reserva territorial, em 31 de dezembro de 1933.

Não falava muito sobre os tempos da guerra, mas dizia que passaram por lá muita fome e tinham de roer os frutos das árvores maninhas. Curiosamente, falava também dos milheirais a perder de vista que havia em Angola, nas margens do rio Cunene, e da preocupação dos agricultores que não conseguiam vender o milho e já não tinham onde guardar as novas colheitas.

Muitos anos mais tarde, quando já vivia em casa dos filhos, a neta Maria da Luz lembra-se de o ver sentado à lareira a falar sozinho. Mal entendiam o que dizia, mas percebiam que eram reminiscências do tempo da guerra.

Condecorações:

·      Medalha comemorativa das operações no sul de Angola;

·      Medalha comemorativa das campanhas na província de Moçambique;

·      Medalha da Vitória;


Família:

Depois de regressar à terra, Francisco casou com Maria Antónia Macedo, filha de António Simão e Carlota Maceda, e tiveram 3 filhos:

1.    José Candeias, que casou com Stela Prata e tiveram 5 filhos;

2.    João Candeias, que casou com Maria de Jesus e tiveram 3 filhas;

3.    Domingos Candeias, que casou com Hermínia Candeias e tiveram 2 filhos.

A felicidade da família não durou muito, porque Maria Antónia adoeceu gravemente, ainda jovem, com tuberculose na laringe. Consultaram muitos médicos e ainda venderam uma propriedade que tinham no Pelome para pagar os tratamentos, mas não conseguiram salvá-la. Faleceu com apenas 35 anos.

«O meu sogro era uma pessoa muito alegre e divertida quando era novo. E diz que a minha sogra também. Andavam sempre a cantar e, quando era no Carnaval, gostavam de se vestir de entrudo e andar pelas ruas, de casa em casa, a pregar partidas a toda a gente. Mas depois a vida mudou porque a mulher morreu, ainda muito nova, e ele ficou com os três filhos pequenos para criar.

Nessa altura quem lhes valeu foi a ti Mari Rosa e a ti Rita, que eram irmãs da minha sogra. A ti Mari Rosa lavava e remendava a roupa (naquele tempo remendava-se tudo e, ainda por cima, quando a minha sogra morreu, os médicos disseram que queimassem tudo, por causa do mal que ela tinha, que era pegadiço); a ti Rita cozia-lhes o pão e ajudava no resto que fosse preciso.

Ao fim de seis anos, o meu sogro voltou a casar com uma mulher do Casal da Serra. Era muito boa mulher, muito trabalhadora e tratou sempre bem os enteados.

A segunda mulher também morreu passados uns anos e o meu sogro tornou a ficar sozinho. Arranjou umas cabritas e ia com elas para uma fazenda que tinha na Serra, e era assim que se “entretia”. Ainda viveu assim uns anos, até que depois ficou doente e passou a andar às temporadas em casa dos filhos.

 As minhas filhas gostavam muito do avô e ficavam todas contentes quando ele estava na minha casa. E ele também tinha muita paciência para elas. Até lhes contava histórias, que sabia muitas e tinha muito jeito para as contar.

No dia 19 de junho, era o dia em que os cachopos foram à inspeção, e quando eles chegaram de Castelo Branco até ainda andou atrás deles, pelas ruas, por causa da concertina; mas quando foi à hora do jantar começou a ficar esquisito e já só disse:

- Isto já é o meu fim. Que Nossa Senhora me acuda…

Ainda chamámos o senhor Doutor e o senhor Vigário, mas já não houve nada a fazer. Só lhe deram os sacramentos.

Está no céu, com certeza, que era um homem muito bom; sempre preocupado com os outros e muito respeitador e temente a Deus.» (testemunho da nora Maria de Jesus).

Francisco Candeias faleceu no dia 19 de junho de 1972. Tinha 79 anos de idade.

(Pesquisa feita com a colaboração do filho José Candeias e da nora Maria de Jesus)

Maria Libânia Ferreira
Do livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"
  

sábado, 19 de setembro de 2020

Os Sanvicentinos na Grande Guerra

 Fernando Diogo

Fernando Diogo nasceu em São Vicente da Beira, no dia 21 de abril de 1895. Era filho de Manuel Diogo e Maria Moreira, moradores na rua da Costa.

De acordo com a sua caderneta militar, sabia ler, escrever e contar corretamente e tinha a profissão de sapateiro, quando assentou praça, no dia 19 de junho de 1915. Foi incorporado no 2.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21, em 15 de maio de 1916, e concluiu a recruta a 29 de agosto.

Fazendo parte do Corpo Expedicionário Português, embarcou para França integrado na 4.ª Companhia do Regimento de Infantaria 21, no dia 22 de janeiro de 1917, como soldado n.º 542 e placa de identidade n.º 9879.

De acordo com o seu boletim individual do CEP e caderneta militar, foi colocado na Escola de Sinaleiros, em novembro de 1917, com as funções de radiotelegrafista.

Em março de 1918, foi-lhe concedida uma licença de campanha de 45 dias, que gozou em Portugal, tendo voltado a França em 4 de maio. Em 10 de junho desse ano, foi promovido a 1.º Cabo Miliciano, passando a fazer parte da 5.ª Companhia com o n.º 672.

Regressou a Portugal, no início de 1919, e passou ao Batalhão n.º 1 da Guarda Fiscal, em 26 de setembro, como soldado de Infantaria. Passou ao Regimento de Infantaria 21, em 27 de fevereiro de 1920. Em 11 de julho de 1920, foi licenciado, vindo domiciliar-se em São Vicente da Beira. Passou à reserva ativa, em 11 de abril de 1928, e à reserva territorial, a 31 de dezembro de 1936.

Condecoração: Medalha Militar de cobre comemorativa da participação portuguesa na Grande Guerra, com a legenda: França 1917-1918.  



Família:

Fernando Diogo casou com Laura de Jesus, também natural de São Vicente da Beira, na 3.ª Conservatória do Registo Civil de Lisboa, a 7 de dezembro de 1919. Tiveram 2 filhos:

1.    Manuel Diogo que casou com Clara Nunes Mourato, e tiveram uma filha;

2.    Maria Manuela Ferreira Diogo dos Santos que casou com Domingos Esteves dos Santos e tiveram 3 filhos.

O casal viveu a maior parte do tempo em Castelo Branco, onde Fernando Diogo trabalhou durante muitos anos como motorista da Junta Autónoma de Estradas. Foi sempre muito considerado por todos os colegas.

Manteve uma grande ligação à terra, onde vinha regularmente, e chegou a ser mesário da Santa Casa da Misericórdia durante vários mandatos, com os cargos de vogal e secretário.

Fernando dos Santos, um dos netos, lembra-se de ouvir o avô falar sobre o tempo em que esteve em França e contar que as situações piores por que passou na guerra tinham sido os bombardeamentos com gases que lhes causavam graves problemas respiratórios. Lembra-se também que, já no fim da vida, apresentava sinais da doença de Alzheimer, mas passava os dias a repetir os gestos de enviar mensagens por código Morse, certamente memórias que lhe ficaram do tempo da guerra.

Fernando Diogo faleceu no dia 29 de Julho de 1974. Tinha 79 anos de idade. Encontra-se sepultado no talhão dos combatentes do cemitério de Castelo Branco.

(Pesquisa feita com a colaboração do neto Fernando dos Santos)

Maria Libânia Ferreira
Do livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"
 

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Os Sanvicentinos na Grande Guerra

 Domingos Rodrigues Inês

Domingos Rodrigues Inês nasceu na Partida, a dia 13 de novembro de 1893. Era filho de Manuel Rodrigues Inês, cultivador, e de Maria Joaquina.

Assentou praça em Castelo Branco, no dia 9 de julho de 1913, como recrutado, e foi incorporado no Regimento de Artilharia de Montanha. Na altura era analfabeto e tinha a profissão de jornaleiro.

Foi mobilizado para a província de Angola, para onde seguiu em 11 de setembro de 1914, integrado na 1.ª Expedição enviada para o sul daquela província ultramarina. Tinha a categoria de soldado condutor. De acordo com a sua folha de matrícula militar, participou na ação do dia 18 de dezembro de 1914 contra os alemães, fazendo parte das forças que ocuparam o vau de Calueque. Regressou a Lisboa a 5 de novembro de 1915 e foi licenciado no dia 15 de maio de 1916.

Em fevereiro de 1917 foi novamente mobilizado para servir na província de Moçambique, para onde embarcou no dia 2 de julho de 1917. Fez parte das tropas de reforço à 3.ª Expedição que na altura já se encontrava muito enfraquecida pelos ataques dos alemães e pelas doenças que incapacitaram ou vitimaram muitos militares. Não há registos do local onde terá estado, nem das ações em que participou. Regressou à Metrópole a 24 de outubro de 1918.

Licenciado em 4 de julho de 1919, passou ao 2.º escalão do Exército e ao 7.º Grupo de B. Reserva, em 31 de dezembro de 1923.

Condecorações:

·      Medalha militar comemorativa das operações realizadas no sul da província de Angola, com a legenda: 1914-1915;

·      Medalha comemorativa das campanhas na província de Moçambique, com a legenda: 1914-1918;

·      Medalha da Vitória.

·      Por o seu Regimento ter sido condecorado com a Cruz de Guerra de 1.ª Classe, ficou ao abrigo do Art.º 43 do Regulamento das Ordens Militares Portuguesas de 1919, podendo fazer uso do distintivo que lhe foi atribuído.

Punições:

a)    10 faxinas por estar ausente sem licença desde as 8.30h do dia 14 de abril de 1914 até à 12.30 h do dia 15. «Não foi punido mais severamente por se considerar que ainda não tinha muita compreensão das regras militares» (folha de matrícula);

b)   4 dias de detenção, por ter o cabelo comprido, quando se apresentou para a distribuição do pré, no dia 4 de maio de 1914;

c)    1 guarda, por se ter rendido no posto do sentinela sem a presença do cabo da guarda, no dia 2 de julho de 1914.

Família:

Domingos Rodrigues casou com Maria da Graça, no Posto do Registo Civil de Almaceda, a 31 de outubro de 1920, e passou a residir nas Rochas de Cima. Foi aí que lhes nasceram os 7 filhos que tiveram: Preciosa Maria, José Inês, Joaquim Domingos Inês, Maria do Carmo, Maria do Santos, Manuel Inês e Maria Inês.

«O meu pai era uma boa pessoa. Tratou sempre bem a minha mãe e aos filhos nunca nos bateu. Guardava respeito a toda a gente e toda a gente cá na terra gostava dele.

Foi moleiro toda a vida, com uma azenha e dois moinhos ali na ribeira, por baixo do Ingarnal. Ele estava quase sempre a moer e eram as filhas mais velhas que andavam com o burro, por aquelas terras à roda, a trazer o cereal e a levar a farinha já moída. Teve uma vida difícil e de muito trabalho porque, naquele tempo, aquilo dava pouco e as bocas eram muitas. Era no tempo em que uma sardinha tinha que dar para três…

Também nunca recebeu nada por ter andado na guerra, porque não se soube mexer, nem teve quem lhe desse a mão: não tinha o braço torto….

Tanto o meu pai como a minha mãe morreram quando eu estava na França. Custou-me muito, mas é assim a vida…» (testemunho do filho Manuel Inês)

Domingos Rodrigues Inês faleceu no dia 30 de agosto de 1975. Tinha 81 anos de idade.

(Pesquisa feita com a colaboração do filho Manuel Inês)

Maria Libânia Ferreira
Do livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"