sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Fontes: convento franciscano

A 7 de novembro de 1714, casou, em São Vicente, Joaõ Martins Mouzinho, natural de Estremoz, 
Tenente de Cavalos da Companhia do Capitão Antonio Velho de Britto, do partido da Beira Baixa. 
A noiva foi Barbara Maria de Oliveyra da Cunha e Sylva, filha do Capitão Manoel de Oliveyra e Cunha e de sua mulher Maria Figueyra de Castellobranco, de Aldeia Nova do Cabo.
Dirão que casamentos há muitos e é verdade. 
Só que esta noiva era recolhida «...no convento das religiosas desta vila...»
E esta? Os pais depositaram (não se choquem com o verbo, era mesmo assim) aqui a sua filha, mas depois arranjaram-lhe um bom partido e pediram autorização ao Reverendo Doutor Provisor deste bispado, que deu ordem ao vigário para que ela saísse do convento.
Tomara eu que a coisa fosse assim tão clara, mas de facto o pormenor que apresento mostra um conjunto de frases não totalmente claras de significado, na parte final.



Este Antonio Velho de Britto era o marido de Dona Ursulla Roballa, 
natural das Sarzedas, que em São Vicente deu nome a uma rua e a uma tapada.

José Teodoro Prata

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Fontes: Casal Duarte da Fraga

Já aqui me referi à origem do topónimo Casal da Fraga: 
durante muitos anos, apenas lá viveu uma família com o apelido Fraga.
E fraga tanto pode ser uma rocha como uma forja (neste caso, inclino-me para este segundo significado).
No dia 20 de agosto de 1714, casou a Luzia Gonçalves, filha de Duarte da Fraga e de Maria Rodrigues.
Mas os pais dela já haviam falecido. Na época, a vida era tão precária que eram poucos os jovens que tinham um dos pais vivo na altura do seu casamento.
Segue-se o registo de casamento da Luzia e por baixo em pormenor, para lerem melhor.



A 6 de novembro de 1715, casou um viúvo que vivia no casal Duarte da Fraga.
Talvez ali trabalhasse como ganhão ou pastor do herdeiro de Duarte da Fraga (sei que tinham gado).
Apesar de já falecido, o Duarte da Fraga deu o nome ao seu casal. Depois ficou só Fraga.
O registo deste segundo casamento apresenta-se em baixo, também com pormenor.



Estes Fraga deram origem aos Jerónimo, 
pelo casamento do filho de Duarte Fraga (Jerónimo Duarte) com a filha dos rendeiros do Casal do Pisco.

José Teodoro Prata

Fontes: Pouzão e Pinna

Na segunda metade do século XVIII (1750-1600), moravam em São Vicente, na rua que vai da praça para a ponte, futura Rua Nicolau Veloso, 
dois padres (Manoel Cabral de Pinna e Estevam Alvares de Pinna) 
e duas irmãs solteiras (Brittis Cabral e Joanna Cabral). 
Eram naturais do Violeiro, filhos de Domingos Nunes Pouzão e Brittis Maria Cabral 
(a tal que foi sepultada na Misericórdia de São Vicente, vestindo o hábito franciscano).
Também já sabeis que este casal tinha uma outra filha (Maria Cabral de Pinna) casada em Tinalhas, 
cujo bisneto foi o primeiro visconde de Tinalhas.
Os primeiros dois documentos abaixo apresentados são o registo de casamento deste casal Domingos Nunes Pouzão e Brittis Maria Cabral e o terceiro é um pormenor do segundo, para lerem melhor.




Não sei se repararam que este casamento é de 1714 
e que o vigário se chamava Estevaõ Alvares de Pinna.
A noiva, órfã de pais (Estevaõ Alvares de Pinna e Mariana Cabral, da Quinta da Canharda, Fornos de Algodres) viveria em São Vicente com o irmão, 
o qual lhe arranjou um bom partido para casar (foi sargento-mor). 
Mas vivia com eles um outro irmão padre, o Manuel Cabral de Pinna,
que aparece a celebrar um outro casamento, nesse ano de 1714, o da Luzia, uma minha parente dos Jerónimo, de quem darei notícias daqui a dias.
Este Manuel Cabral de Pinna foi depois prior da Igreja de São Silvestre, na Covilhã.

Curioso que os irmãos padres desta família, em duas gerações diferentes, eram um Estevão e outro Manuel.


José Teodoro Prata

terça-feira, 29 de novembro de 2016

As crianças devem sujar-se?

Muito se tem falado sobre a falta de contacto das crianças com as brincadeiras de rua. Médicos de família, nutricionistas e especialistas em psicomotricidade  alertam para a falta de mobilidade das crianças e para a obesidade infantil.
Habitualmente, desenvolvo um projeto sobre Horta Escolar e planto diversos legumes. Sempre que me é possível, dou um saltinho à horta e noto que inicialmente os miúdos sentem um grande constrangimento em mexer na terra. Os dias de rega são os favoritos, pois a mangueira verte alguma água e faz pequenas poças. Um dia, contei-lhes que quando era da idade deles brincava com a terra e fazia bolinhos. Incentivei-os a fazer a experiência e foram eufóricos para a sala a perguntar se para a próxima podiam repetir a brincadeira. Uns dias depois, voltámos à horta e uma aluna disse não poder ajudar; os pais tinham proibido por ter chegado a casa com os sapatos sujos de terra.
Fiquei perplexa por pensar nos pais atuais, com máquinas para tudo. A minha mãe criou oito filhos e nunca nos proibiu de brincar ou reclamou por nos sujarmos. Claro que o meu pensamento foi até à Tapada da minha infância. 

Aproveitávamos os dias em que a minha mãe ou a tia Stela despejavam as presas da Barroca, para regar as hortas ou armazenar água no tanque. As regueiras ficavam cheias de água límpida e nós começávamos a azáfama. Fazíamos um cone de terra e com o cotovelo uma cavidade na ponta. Deitávamo-nos ao lado do rego e com a boca, sorvíamos um gole de água que lançávamos na cova redondinha. Víamos a água a desaparecer e esperávamos um pouco. Com os dedos indicadores, íamos afastando a terra solta e com muito cuidado pegávamos na malguinha que colocávamos na palma da mão. Ficávamos encantadas por ver como tinha ficado perfeita! Era colocada, com muito jeitinho, nas saliências da rocha que servia de cozinha. Voltávamos ao rego e a brincadeira continuava pela tarde fora. Diversas sementes seriam o arroz que iria encher as malgas.
Entretanto, íamos vigiando o caudal do rego para sabermos o momento de irmos tapar as presas à Barroca. Pegávamos num sacho e íamos por uma vereda junto ao rego. Chegadas às presas, verificávamos se realmente estavam completamente despejadas. Colocávamos a tranca na parte exterior do alvanel e na parte de dentro colocávamos terra que era apertada coma as mãos e com o sacho, para não haver o perigo de vazar durante a noite. O mais difícil era tapar a mina. À entrada víamos um túnel cavado na rocha e ao fundo uma imensa escuridão. A água era escura, pois o desnível provocado pelas areias acumuladas, à boca da mina, fazia com que ela ficasse sempre com bastante água. Para a tapar por dentro, era preciso inclinar-me sobre a água e tatear até encontrar a cavidade que tinha que ser fechada com torrões para ficar completamente selada. Imaginava serpentes a enrolarem-se à volta do braço e, quando terminada a tarefa, suspirava de alívio. Regressávamos a casa felizes por termos cumprido bem a nossa missão. A nossa mãe perguntava sempre:
 - Então as presas ficaram bem tapadas? Vejam lá se amanhã, quando o dono da água as for despejar, não encontra lá nada!

Conceição Teodoro

sábado, 26 de novembro de 2016

Canja de cobra

O sacristão Manuel subiu as escadas da torre e encostou-se à varanda voltada para o cimo da vila, a saborear o ar fresco da manhã. De seguida pegou nos badalos e começou a badalar as ave-marias. O sol ainda se escondia por detrás da Oles, mas aos poucos inundou toda a vila e campos em redor. Camponeses, jornaleiros e proprietários iam a caminho das hortas para iniciarem mais uma jornada de labor.
O portão do quintal da casa do César abriu-se e o ganhão Dionísio à frente do carro de bois seguiu pela rua das Laranjeiras, em direção à Fonte Velha, a caminho da Tapada do João Gago. Todos os ganhões; “e eram muitos” seguiam cada um sua vida. Alguns dirigiam-se aos pinhais carregar lenha para os fornos comunitários…
Jornaleiros trabalhavam de sol a sol.
Antes de partirem para os trabalhos campestres muitas pessoas assistiam à missa da manhã.
Quando os homens trabalhavam perto da vila as mulheres levavam-lhes o café “por volta das dez da manhã fazia-se uma pausa”. À uma hora, ao toque das trindades, jornaleiros paravam os trabalhos, jantavam e dormiam a cesta. À tarde, nova paragem para se merendar: Um naco de pão com umas azeitonas, uma fatia de queijo…
Naquela época um novo prior tinha chegado há poucos meses à vila, depressa granjeou a simpatia do povo, sempre bem-disposto, comunicativo, mestre-escola…
Ao novel hospital chegavam doentes de toda a freguesia e das freguesias vizinhas para encontrarem a cura dos seus males. Em frente situava-se o tronco do senhor Bonifácio, quando não havia alimária para ferrar ele e o seu ajudante Joaquim da “burra” faziam ferraduras e canelos. Joaquim da “burra” de vez em quando gritava, rebolava no chão cheio de dores.
Meu pai dizia que lhe saiam as tripas “mais tarde soube que era quebrado”.
Ciganos acampavam detrás da capela de São Sebastião e o mestre Ventura juntamente com seus filhos fazia carros de bois na oficina que ficava por baixo da sua casa. Certa vez; eu ia a passar, encaro com uma cigana a esfolar uma cobra, uma panela de ferro aquecia água na fogueira, cortou-a em vários pedaços e meteu-a na panela. Assustado, segui caminho com a cesta na mão onde ia o jantar do meu pai. Quando cheguei à Oles, contei-lhe e respondeu-me:
- As cobras fazem uma canja tão boa ou melhor que a canja de galinha
Não fiquei convencido…
Era o tempo das malhas, ganhões transportavam faixas de centeio, trigo, para as eiras.
A eira da dona Luz estava cheia de rolheiros.
Malhadores desatavam os nagalhos, estendiam as faixas, ouviam-se os manguais com cadência ritmada debulharem as espigas, a palha ia sendo retirada ficando a semente misturada com as praganas, à tardinha aproveitando a nortada, procediam à sua limpeza enchiam um meio alqueire que levantavam no ar e iam lançando a semente para a eira, o vento empurrava as praganas e as rabeiras. A semente caia em cima de umas giestas, aos poucos o monte crescia, os catxiços eram retirados e juntavam-se a um canto. A palha de centeio aproveitava-se para as enxergas, a trigueira não prestava, desfazia-se, dava-se aos animais.
O ar fresco dava lugar ao calor que se tinha feito sentir durante o dia, os notáveis, remediados e os ricos da vila reuniam-se em São Sebastião, sentavam-se nos cais que cercam a capela, cavaqueavam sobre os mais diversos temas.
Uma das pessoas habituais nas tertúlias estivais daquela época era o padre José David.
Conversa puxa conversa “são como as cerejas”; a certa altura diz:
- Meus amigos; quando cheguei a São Vicente a primeira pessoa que confessei foi uma mulher; disse-me que era bruxa, fiquei sem saber o que lhe havia de dizer, não contava com tal segredo. Absolvi-a e, como penitência mandei-a rezar cinco pai-nossos e cinco ave-marias.
Eis senão quando na estrada passa uma mulher com um cesto à cabeça cheio de hortaliças:
- Boa tarde; saiba vossa reverência que tenho a consolação de ser a primeira pessoa que vossa reverência confessou na nossa terra.
O padre ficou sem pinta de sangue, todos os presentes ficaram a saber quem era a bruxa.
Anoitecia, sacristão tocava as ave-marias. À vila chegavam os camponeses, jornaleiros… na Fonte Velha sentavam-se nos cais com a enxada ao lado, as mulheres esperavam a sua vez para encher cântaros, regadores… algumas passavam com o tabuleiro à cabeça deixando um rasto cheiroso e agradável a pão acabadinho de cozer.
Outros, entravam na taberna do João coxo e emborcavam um cajeirão.
Fiquem bem.

J.M.S 

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

O livro dos enxidros

Após as sessões com os alunos do 1.º ciclo de Alcains, há oito dias, achei que devia prestar contas a quem nos pagou o livro. Por isso enviei, via e-mail, ao sr. presidente da Câmara, a mensagem que se segue:

Senhor presidente:
Na passada quinta-feira, concluímos as apresentações do livro "Dos Enxidros aos casais: histórias e gentes de São Vicente da Beira". Eventualmente, faremos mais uma sessão em São Vicente e a Dr.ª Adelaide Salvado pediu-me que fosse à USALBI falar sobre este projeto, mas não marcámos data.
Como coordenador do projeto, cabe-me fazer um primeiro balanço:
·  O livro foi apresentado em São Vicente (uma sessão para a população em geral e outra no Lar), Partida, Castelo Branco e escolas de São Vicente e Alcains (aqui em 5 sessões, para os alunos do 6.º ano que haviam ilustrado o livro e para todos os alunos do 1.º Ciclo). Totalizam 10 sessões em que o público aderiu entusiasticamente ao livro. 
·  As sessões no Lar de São Vicente, em Castelo Branco e na Partida contaram com a animação do coro do Rancho Folclórico Vicentino, que cantou canções inseridas em algumas histórias.
·  O sucesso deste projeto ultrapassou largamente as melhores expetativas dos autores e tal facto deve-se sobretudo à estreita relação entre as histórias do livro e as vivências das pessoas. Diria que o livro aborda o património cultural das populações.
·  O número de vendas terá já ultrapassado as duas centenas.


Eu e a Libânia, na biblioteca da escola do 1.º ciclo, em Alcains.

O senhor presidente da Câmara respondeu de imediato, 
agradecendo a gentileza deste gesto, 
dando-nos os parabéns pelo sucesso do livro, que acompanhara pelo vereador da cultura e pela comunicação social, 
e disponibilizando-se para nos apoiar em novos projetos.

José Teodoro Prata

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Fontes: Barbaído



No dia 13 de setembro de 1713, casaram Manoel Gonçalves e Izabel Fernandes.
Como podem ver no pormenor, o noivo era 
«...do Casal do Barbaído desta freguesia de Nossa Senhora da Assumpçaõ...».
Já sabia que era a Câmara de São Vicente que nomeava anualmente o juiz do Barbaído, em vez de ser escolhido pelos moradores do Freixial e do Barbaído, como acontecia com a Torre do Louriçal.
E também que era o Vigário de São Vicente e não o cura do Freixial quem ia anualmente fazer a festa de São Brás, recebendo por isso o respetivo pagamento.
Agora, este registo de casamento vem informar que, em 1713, o Barbaído ainda pertencia à freguesia (paróquia) de São Vicente.

José Teodoro Prata