José Teodoro Prata
Fotos do Francisco Barroso
Enxidros era a antiga designação do espaço baldio da encosta da Gardunha acima da vila de São Vicente da Beira. A viver aqui ou lá longe, todos continuamos presos a este chão pelo cordão umbilical. Dos Enxidros é um espaço de divulgação das coisas da nossa freguesia. Visitem-nos e enviem a vossa colaboração para teodoroprata@gmail.com
Quando no ano passado o meu cunhado Quim, que comprara uma máquina de varetas, me disse que se colhia com ela muito mais depressa a azeitona, soube que estava lixado. O meu método era (é) arcaico, e consequentemente demorado, e por isso eu não poderia responder aos níveis de exigência cada vez maiores dos lagares, em termos de qualidade da azeitona ali entregue.
Para equacionar mais facilmente a questão, vou-a explanar em dois
tópicos:
- Este ano entreguei azeitona em dois lagares (quantidades
ridículas) e em ambos estive cerca de 5 horas, com filas de dezenas de veículos
a aguardar a sua vez. Primeira conclusão: os lagares não dão resposta ao ritmo
de colha das pessoas.
- No lagar de Vila Velha de Ródão é proibido entregar azeitona
em sacas, norma que eu desconhecia por não ir lá há 3 anos. Uma camioneta carregada
de sacas foi mandada embora e eu fiquei, porque levava pouca, mas toda a
azeitona foi inspecionada e 6 sacas foram recusadas. No Ninho do Açor aceitam
azeitona em sacas, mas com críticas a quem as leva, pois, com o calor que esteve,
a azeitona degrada-se nas sacas em poucas horas. Uma pessoa que levava azeitona
já podre (em sacas) sofreu a pena de a sua produção ser feita à parte (em ambos
os lagares, a azeitona vai para um monte comum e a cada produtor é entregue o
azeite correspondente ao peso de azeitona e ao nível de gordura revelado na análise
realizada no momento da entrega). Segunda conclusão: as sacas de plástico transparente,
tão defendidas há alguns anos, são cada vez menos aceites e de facto contribuem
para a degradação rápida da azeitona, em tempo quente com o que tivemos este
ano, na segunda e terceira semana do mês.
Como perceberam, a falta de resposta dos lagares dificulta a
entrega da azeitona com a melhor qualidade possível. Há lagares que a aceitam
podre, mas eu no ano passado fiquei com azeite de má qualidade porque, num
lagar onde fui, o cliente imediatamente anterior a mim entregou azeitona podre e
a dele e a minha foram feitas juntas, pois eram em pequena quantidade.
O aquecimento global (este ano, os meses de outubro e novembro
bateram recordes) vem agravar este problema, pois na árvore a azeitona vai
sofrer mais com a gafa e, após a colha, a azeitona tenderá a degradar-se depressa.
Para terminar, deixo um apontamento ecológico, sugerindo um
contributo de cada um de nós para mitigar o aumento das temperaturas. Tem a ver
com o que fazer com as ramagens da colheita ou da poda. Portugal vai estar a
arder até lá para março, devido às tradicionais queimas da rama das oliveiras.
As ramagens são carbono. Se ficarem no solo, esse carbono transformar-se-á em
novas ramagens. Se forem queimadas, sobem para a atmosfera na forma de dióxido
de carbono e vão contribuir para o aquecimento global. É verdade que Portugal é
campeão no tráfego aéreo de aviões a jato, é campeão no estacionamento de
navios-cruzeiro (ambos altamente poluentes e restringidos ou proibidos em
alguns países) e está na cauda da Europa em termos de reciclagem (apenas
12% do lixo), mas cada um de nós deve fazer o que está nas suas mãos, para que o
planeta continue a ser habitável para os humanos. Sugestão: amontoar as
ramagens em local onde não estorvem.
José Teodoro Prata
Na segunda-feira, 20 de novembro, comemorou-se a adoção da Declaração dos Direitos da Criança (1959) pela Assembleia das Nações Unidas, e a Convenção sobre os Direitos da Criança (1989). Que me tivesse apercebido, não houve nas notícias grande desenvolvimento sobre o tema, mas ficámos a saber que Portugal perdeu cerca de um milhão de crianças nos últimos cinquenta anos.
Este
número já não nos surpreende, mas preocupa-nos, principalmente porque a queda
dos números da população mais jovem acontece sobretudo nas zonas rurais, onde
os velhos são cada vez a fatia maior.
Segundo a Wikipédia, de acordo com o censos de 2021, a evolução dos números na nossa freguesia, nos últimos vinte anos, foi esta:
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Os
números totais têm vindo a diminuir muito de década para década, mas é na
população infantil e jovem que a queda é pior.
Curiosamente, parece que em São Vicente e nas freguesias cujas crianças frequentam a nossa escola, a situação melhorou um pouco: este ano o Jardim de Infância tem duas salas.
M. L. Ferreira
*O
título do texto é o tema proposto para as comemorações deste ano de 2023 da
adoção dos Direitos da Criança.
Visitei, no passado sábado, a capela de São Pedro de Vir-a-Corça, no Carroqueiro, Monsanto. Contaram-me a lenda da capela, referida no texto abaixo, e surpreendi-me de ali ser uma corça a amamentar um bebé, tal como a donzela da nossa Orada foi amamentada por uma corça.
Contou-me
o ti´ Joaquim Teodoro, em 1990: «Um pai encontrou a filha grávida e, para
não a matar, levou-a para o sítio onde está a cruz. Havia lá uma cova e o pai
deixou-a lá. Por Deus apareceu uma corça e ela mamava a corça, mas vinha beber água
à fonte, atrás da capela.»
A corça era venerada pelos lusitanos, como a seguir se refere, o que localiza
a Senhora da Orada numa época remota, anterior ao Cristianismo e mesmo à
conquista romana da Hispânia.
Encontrei o texto que se segue na net, cuja riqueza torna desnecessário alongar
mais.
«Simbologia da Corça
A
corça está intimamente ligada à feminilidade. Por alguma razão, conhece-se
melhor a espécie pelo seu nome feminino – a corça, em detrimento do corço. Com
efeito, são várias as lendas europeias onde ela chega como salvadora pelo leite
que dá como alimento, até a humanos. Assim é com Genoveva de Bravante, uma
lenda de fundo germânico ou nórdico que discorre acerca de uma foragida,
falsamente acusada de infidelidade, que se exila num ermo nas Ardenas com o seu
filho, alimentado este pelo leite de uma corça que lá apareceu. Em Portugal, é
também o leite de uma corça que salva um bebé adotado por um homem em
Vir-a-Corça, junto a Monsanto. Ambas as lendas aludem ao papel materno do
mamífero, a fêmea que amamenta, a fonte da vida. Há teorias que defendem a
divinização da corça pelos lusitanos, assumindo até que Sertório, para cair nas
boas graças lusas, inventou que estes animais falavam com ele. Seria o
eremitismo tão conhecido nos corços que provocava um fascínio tal na mente
humana ao ponto de os ter como um reflexo divino? Não devemos esquecer, da
mesma forma, a corça na mitologia grega, com os seus chifres de ouro e pés de
bronze – é consagrada a Artémis (mais uma vez, uma mulher) e, segundo um
episódio mítico, foi nela que Taigete se transformou para escapar a Zeus, sendo
procurada depois por Héracles (ou Hércules, na versão romana) num dos seus doze
trabalhos de penitência. Houve igualmente, como com a maior parte dos animais
antes venerados por cá, uma tentativa de diabolização, sobretudo com a chegada
da mensagem cristã que pretendeu redirecionar os atos celestes para as Senhoras
e os Santos. A lenda da Nossa Senhora da Nazaré, por exemplo, põe D. Fuas
Roupinho atrás de uma corça (ou de um veado, depende da versão) com o seu
cavalo, para mais tarde se aperceber que esta era afinal uma reencarnação do
demónio.»
RICARDO BRAZ FRADE
https://www.portugalnummapa.com/corca/
José
Teodoro Prata
Foi um equívoco de
séculos. Bem, quer dizer, de anos, muitos anos, eu convencido que por aí se
dizia que, aos de São Vicente, os povos das redondezas chamavam Gravatinhas.
Na semana passada, na
Biblioteca Nacional, estive com Jaime Lopes Dias, que deixou escrito que essa
era alcunha dos de Alpedrinha, a que também chamavam Manilhas; idem Gravatinhas,
os de Penamacor. Um homem pode andar anos enganado, afinal!
Achei que poderia
interessar a Vossas Excelências o escrito integral em que o estudioso trata do
assunto; mas, como é longo, 5 páginas impressas, deixo somente o registo do que
a São Vicente e algumas terras mais próximas diz respeito. Aqui vai, e que lhes
faça bom proveito.
Com amizade,
Sebastião Baldaque
ALCUNHAS
por
Jaime Lopes Dias
(extracto)
Sardanascas, os das aldeias dos arredores de
Castelo Branco.
Cucos, os de Aldeia de João Pires e do Louriçal
do Campo.
Unhas Negras, os de Alcains. Diz-se também:
Alcains, terra de cães. Ao que os naturais respondem "Terra por onde eles
passim" (passam).
Manilhas e Gravatinhas, os de Alpedrinha.
Alfacinhas, os de Castelo Novo.
Mafras, os da Soalheira.
Batatas, os do Casal.
Chamiceiros, os de São Vicente.
Mata-Lobos, os do Sobral.
Gatunos, os do Ninho.
Semagreiros, os de Tinalhas.
Carreiros, os da Póvoa.
Fura-Balsas, os de Escalos.
Pelados, os da Lousa.
Bogalhões, os da Lardosa.
Cabreiros, os de Souto da Casa.
Cravinas, os de Aldeia Nova do Cabo.
Borrados, os de Aldeia de Joanes.
Cabeças de Burro, os do Fundão.
P. S. Quem tiver interesse, poderá ler o
escrito integral na Etnografia da Beira,
vol. III, edição, creio, de 1926, na rubrica "Alcunhas". Mais à mão,
tenho imagens dessas páginas, que coloquei no seguinte endereço:
José Simão
José Simão nasceu no Casal da Fraga, a 17 de maio
de 1893. Era filho de Joaquim Simão, jornaleiro, natural da freguesia de S. Vicente
da Beira, e de Felícia Maria, doméstica, natural de Rochas de Cima.
Assentou praça no dia 9 de julho de 1913, como
recrutado, e foi incorporado no 2.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21 em
13 de janeiro de 1914, como atirador de 1.ª classe.
Pronto da instrução da recruta em 30 de abril,
foi licenciado em 1 de maio, regressando a São Vicente da Beira.
Apresentou-se novamente em 5 de maio de 1916 e,
fazendo parte do CEP, embarcou para França em 21 de janeiro de 1917, integrando
a 6.ª Companhia do 2.º batalhão do 2º Regimento de Infantaria 21, no posto de
soldado com o n.º 92 e a chapa de identidade n.º 44924.
Da sua folha de matrícula e boletim individual
do CEP consta o seguinte:
a)
Punido
em maio de 1916, pelo Comandante da Companhia, com 2 faxinas, por estar sentado
na cama durante o dia e não se ter levantado prontamente à voz de sentido dada
quando o comandante entrou na caserna;
b)
Punido
em 20/08/1917, pelo Comandante da Companhia, porque, quando se fez a distribuição
do vinho à Companhia, disse para alguns dos seus camaradas que os rancheiros
não lhes davam a ração que era dado e eram todos uns ladrões;
c)
Punido
em 16/03/1918, pelo Comandante da Companhia, com 10 dias de detenção, por
faltar aos trabalhos de S. Naast, no dia 13;
d)
Punido
em 02/05/1918, pelo Comandante da Companhia, com 4 dias de detenção, por ter
faltado aos trabalhos, em 28 de abril;
e)
Punido
em 17 /9/1918, com 12 dias de detençã,o por ter feito uso dum passe
regulamentar fora da data, que lhe tinha sido concedido em vez de o ter
entregado, saindo da sua área de estacionamento sem autorização;
f)
Aumentado
ao efetivo do Depósito Disciplinar 1, em 26 de setembro de1918, onde ficou com
o n.º 718, porque, de acordo com a folha de matrícula "encontrando-se com prevenção de marcha para
um novo acampamento mais avançado em relação à frente do inimigo,
insubordinou-se, recusando a desarmar as barracas e a entrar na formatura,
ameaçando matar com granadas de mão e a tiros de metralhadora todo aquele que
tal fizesse, como também se recusando a entrar em ordem às intimações que lhe
foram feitas pelos seus superiores";
g)
Marchou
em diligência do Depósito Disciplinar 1 para o Tribunal de Guerra, a fim de ali
ficar à disposição daquele tribunal, em 22/02/1919;
h)
Em
16 de março de 1919, foi condenado pelo Supremo Tribunal de Guerra, na pena de
7 anos de presídio militar e mais na pena acessória de igual tempo de
deportação militar ou, em alternativa, na pena de dez anos de deportação
militar;
i)
Repatriado
para Portugal, no dia 05/06/1919, com o Serviço de Adidos, na condição de
condenado;
j)
Passou
ao presídio militar de Santarém, em 28 de junho, a fim de cumprir a pena a que
tinha sido condenado;
k)
Amnistiado
pela Lei n.º 1198 de 2 de setembro de 1921, foi solto por ordem da Secretaria
da Guerra e passou ao Regimento de Infantaria 21, em 26 de Setembro de 1921.
Foi licenciado em janeiro de 1922 e domiciliou-se em São Vicente da Beira.
Passou ao Regimento de Infantaria de Reserva 21,
em 31 de dezembro de 1923, e ao Regimento de Infantaria 11, em 17 de julho de
1931, por ter transferido a residência para a freguesia de Bocage, em Setúbal.
Passou à reserva ativa em abril de 1928 e à
reserva territorial em Dezembro de1934. Em 31 de dezembro de 1934, foi-lhe dada
baixa por ter cumprido toda a obrigação de serviço militar.
Família:
José Simão casou com Gertrudes Rosa, na
Conservatória do Registo Civil de Setúbal, no dia 21de outubro de 1925. Sabe-se
que tiveram filhos e netos, mas não mantiveram um relacionamento de grande
proximidade com os familiares em São Vicente da Beira. Não existem, por isso,
muitas memórias deste ramo da família.
O casal terá vivido sempre na cidade de Setúbal e foi ali que José Simão faleceu, na freguesia de Nossa Senhora da Anunciada, no dia 19 de Fevereiro de 1975. Tinha 81 anos de idade.
Maria Libânia Ferreira
Do livro: Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra
Os passageiros eram, quase todos, homens e mulheres a quem o trabalho duro de uma vida inteira fazia aparentar uma idade que não tinham.
Saíram
das suas terras, ainda jovens; alguns seguiram o rasto dos pais, que, antes
deles, procuraram lá fora a vida que em Portugal nem podiam sonhar.
Eram do
Alentejo, das Beiras, de Trás-os-Montes, do Minho… mas as memórias que
partilhavam eram o testemunho do atraso e da pobreza comuns, quase hereditários,
que se vivia em todo o país.
Falavam
do frio e das molhas, ainda crianças, atrás de um rebanho de cabras ou à frente
de uma junta de bois; do calor escaldante dos dias da ceifa ou do alcatrão a
ferver que espalhavam nas estradas que cresciam por todo o lado; dos molhos de
mato e das sacas às costas, cada vez mais pesados, na pressa de se fazerem
homens e mulheres e terem um salário melhor; alguns ainda foram à guerra,
outros livraram-se por pouco, e quase todos lá tiveram um irmão mais velho ou
parente chegado.
Mas
ainda não esqueceram os jogos e as cantigas de outros tempos; as festas e
romarias com procissões e bailaricos; a mesa farta desses dias com a família
toda à roda. As mulheres, essas, trocavam receitas de bolos, mesinhas e orações
para todos os males, e mostravam, orgulhosas, as fotografias dos netos e das
flores do jardim à frente da casa com que sempre sonharam.
Foram
difíceis, os primeiros tempos em França. Durante anos não houve domingos nem
dias santos; mesmo as férias eram passadas a levantar mais um bocado da casa ou
a tratar das terras que, a pouco e pouco, iam juntando aos bocados que herdaram
dos pais ou já tinham comprado; não se sabia o que era ir a um restaurante e
muito menos a uma praia. Também quiseram dar aos filhos outras ferramentas para
a vida: a maior parte não tinha passado da quarta classe, quando muito do
segundo ano, quando foram obrigados. É que os pais deles, sobre a importância
das letras, o que sabiam era dizer aos professores que lhes chegassem sempre
que fosse preciso.
Agora,
quarenta e muitos anos depois, e já todos reformados, voltam à terra duas ou
três vezes por ano, por altura das festas e para a apanha da azeitona ou da
castanha, mas demoram-se por cá pouco. E já não pensam regressar de vez, que é
lá que têm os filhos e os netos, e esses cada vez menos querem vir a Portugal.
Não
admira que as terras estejam a ficar cada vez mais vazias de gente. Algumas já
nem têm escola, nem padre, nem crianças pelas ruas. Por este caminho, qualquer
dia, só velhos e os mortos no cemitério, que é também o que os vai trazendo até
cá por estes dias.
M.L.Ferreira
O título acima é demasiado pomposo para dois simples apontamentos sobre a edição de 2 de novembro do referido jornal.
Logo na página 3 noticia-se o Dia dos Sinos dia 4, sábado. Nada se informa sobre os artistas (os tocadores), que parece terem passado a operários e por isso sem direito a referência. Por isso não sei se o nosso Pedro Inácio veio cá tocar. Em qualquer dos casos, continua a dever-nos um toque dos sinos na nossa igreja, por ter cá vindo no ano passado. Ficamos a aguardar.
A página 10 traz referência, em quase toda a página, à tese de mestrado da Ana Rute Inácio (penso que a filha do Pedro Inácio) apresentada na Vila a 21 de outubro. A tese foi orientada pela Maria João Guardado Moreira, neta do sr. Manuel da Silva, e por outro professor. Penso que a mestre Ana Rute se formou em Assistência Social, na ESE de Castrelo Branco.
A tese propõe a criação de uma rede de apoio social para a população mais fragilizada da nossa freguesia, sobretudo os idosos, envolvendo todas as instituições da freguesia e sem atropelar os serviços já prestados pela Santa Casa da Misericórdia. E a Ana Rute defende que a sua proposta pode ser aplicada a qualquer freguesia. Parabéns à nova mestre!
José Teodoro Prata