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sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

O Pelourinho

 Há dias, a propósito do artigo sobre a digitalização dos jornais pela Biblioteca de Castelo Branco, não respondemos à dúvida sobre se existiria o Pelourinho na Biblioteca Hipólito Raposo. De facto não existe. Há apenas um exemplar que foi doado, há tempos, pela Maria José (Alfaiate). É o número 2, publicado em 15 de setembro de 1960, era diretor o padre Sílvio.

Era bom que fosse possível reunir todos os números publicados (também de O Vicentino) e torná-los acessíveis através da digitalização. É que, dando-nos conta, mensalmente, dos acontecimentos mais importantes em cada uma das povoações da freguesia, foi um documento fundamental para ficarmos a saber quase tudo sobre a vida de São Vicente durante várias décadas: dados económicos, sociais, demográficos, culturais, costumes, valores, etc. que muitos vivemos e ainda recordamos, mas a maior parte da população mais jovem nem imagina.

Deixo algumas das notícias deste Nº2; acho-as significativas porque testemunham bem como estávamos todos irmanados nas alegrias, nas tristezas e nas necessidades mais básicas:

 - No Mourelo pedia-se às “Exmas. Autoridades” que fosse feito um chafariz para abastecimento de água à população, porque a única fonte disponível era ainda a Fonte de Mergulho, “pouco higiénica e muito distante”; realizara-se a festa de Santo António, “glorioso protector”, com missa e sermão feito pelo Padre Sílvio e cânticos dirigidos por um seminarista da Guarda; deu-se ainda conta da visita de várias pessoas aos seus familiares.

- Na Partida ansiava-se ainda pela chegada da estrada e pedia-se ajuda para o arranjo de alguns caminhos; a população viveu em festa, entre os dias 26 de agosto e 5 de setembro, pela presença de um grupo de seminaristas da Guarda que “… proporcionaram a todos momentos de inesquecível prazer espiritual”; também houve grande satisfação pela chegada de alguns conterrâneos vindos de França ou de Lisboa para passarem férias com a família; no dia 3 de setembro faleceu a senhora Amélia Bonifácio de Carvalho.

-Nos Pereiros festejava-se já a chegada da nova estrada que tanto iria beneficiar a população; mas chorava-se a morte de uma criança de 2 anos, num incêndio num palheiro, e queimaduras graves na mãe ao tentar salvar o filho; esteve de visita à família o senhor João António Varandas, sócio gerente da Fogás Lda.

 - Na Paradanta esperava-se com impaciência a construção da escola, tanto mais que a população estava disposta a ceder o terreno no local que as “Exmas. Autoridades” julgassem mais adequado; estavam ainda de férias alguns estudantes da terra (6, no total!), e também o “menino” Norberto Gomes Filipe tinha ficado bem no exame de admissão ao Liceu; o senhor António Gomes Filipe e esposa pediram, para seu filho, a mão de D. Maria Emília Ventura Russo “Professora Oficial”, filha do senhor Alfredo Ventura Russo e da senhora D. Trindade Diogo Ventura Russo; faleceu inesperadamente a esposa do senhor Álvaro Martins Faustino.

 - No Vale de Figueiras festejava-se o início das obras de alargamento do caminho de acesso à povoação; pedia-se a construção de uma fonte com “água pura”, em alternativa à dos poços e presas; deu-se também conta da participação de muita gente em algumas atividades e cerimónias religiosas realizadas pelos seminaristas da Guarda (na Partida) onde viveram uma “alegria sã e vida piedosa”.

- No Casal da Serra fora caiada a igreja e dourado o altar, que “ficou muito bonito”; continuava também em construção a estrada até ao Louriçal, que vinha encurtar o caminho de acesso à Estação e pediam-se também melhoramentos no caminho para a sede da freguesia; dava-se notícia da visita de várias pessoas, residentes fora, às suas famílias.

- No Violeiro pediam-se melhoramentos nos caminhos, autênticos lodaçais no inverno; festejava-se ainda os bons resultados nos exames dos estudantes José António Rato e Conceição de Jesus Rato e a partida de Francisco Magueijo para o seminário de Fátima; desejava-se boa viagem ao senhor José Roque, esposa e filhos, que regressavam a França onde residiam há sete anos.

 - No Tripeiro festejava-se a chegada do telefone com muita alegria porque “já podiam fazer-se ouvir ao longe sem a triste necessidade de percorrer longos caminhos lamacentos”; dava-se a notícia de que a escola estava quase pronta, pelo que se agradecia muito ao “Estado”; iam também ter água canalizada em breve, coisa para admirar porque outras terras maiores ainda não a tinham; dava-se também conta da vitória, num jogo amigável, entre a equipa da terra e a do Mourelo.

 - Em São Vicente iam realizar-se, nos dias 18, 19 e 20 as festas em honra do Santíssimo Sacramento, do Senhor Santo Cristo e de Nossa Senhora do Carmo; No dia 15 de Agosto tinha-se realizado “com grande fervor”, a festa em honra da nossa Padroeira: “… a imagem da «Senhora da Ordem» foi conduzida processionalmente até à Sua Capela. Subiu ao púlpito o Rev. Frei Crespo…”; estiveram em São Vicente, entre muitas outras pessoas, Amélia Rey Colaço Robles Monteiro e Mariana Rey Monteiro e filhos; esteve também a D. Aldina Caldeira com o marido e uma excursão, vinda de Lisboa, organizada pelo senhor Elias; estiveram na Vila os “montadores” do relógio novo para darem algumas instruções sobre o seu funcionamento e já havia quem tivesse contribuído para o seu “badalar”; no dia 21 de agosto a equipa de futebol “os Novatos de São Vicente da Beira” tinha ganhado à equipa da Partida (parece que pela primeira vez…); pelos “ Novatos” alinharam Chico, Martins (1 golo), Dias e Jaime, Nicolau e Ribeiro, L. Bruno, Quica (3 golos), Barroso, Inverno e Luís.

M.L. Ferreira


Nota: Há comentários novos na postagem anterior.

José Teodoro Prata

sexta-feira, 6 de outubro de 2023

Os Sanvincentinos na Grande Guerra

 José Silvestre 

José Silvestre nasceu na Paradanta, a 1 de outubro de 1893. Era filho de Silvestre dos Santos, carvoeiro, e de Anna Rita, natural do Vale d’Urso.

Como era habitual nas famílias mais pobres, começou a trabalhar desde muito cedo, primeiro no campo, como jornaleiro, e mais tarde como pedreiro.

Assentou praça a 9 de julho de 1913, no Regimento de Artilharia de Montanha, em Castelo Branco, e foi incorporado em 13 de janeiro de 1914. Ficou pronto da Instrução da Recruta em 4 de julho e passou ao quadro permanente em virtude de sorteio.

Mobilizado para a província de Angola, embarcou em 11 de setembro de 1914, integrando a 1.ª Expedição enviada para aquele território ultramarino. Chegou ao porto de Moçâmedes em 1 de outubro.

Participou na ação do dia 18 de dezembro de 1914 contra os alemães, fazendo parte das tropas que ocuparam o vau de Calueque. Pertencia ao destacamento que reconquistou e ocupou o Cuamato, de 12 a 27 de agosto, tendo participado também na ação do Ancongo, em 13 de agosto de 1915, e no combate da Inhoca, em 15 do mesmo mês, dia em que o seu destacamento entrou no Forte de Cuamato.

Com o mesmo destacamento avançou em 20 de agosto sobre Cunhamano, a fim de restabelecerem as comunicações que haviam sido cortadas pelo inimigo. No dia 24 participou também no combate da Chana da Mula, dia em que, com o mesmo destacamento do Cuamato, se reuniu às forças do destacamento de conquista do Cuanhama. Fez parte do estacamento da N’giva, de 28 de Agosto a 18 de Setembro de 1915.

Regressou à Metrópole em 16 de novembro de 1915 e foi licenciado em 15 de março de 1916, regressando à Paradanta. Mas voltou a ser mobilizado passado pouco tempo, em 27 de abril. Contava que nessa altura andava a trabalhar longe de casa e, quando recebeu a carta para se apresentar novamente, teve que regressar a correr. Só teve tempo de meter qualquer coisa dentro duma bolsa e partiu a pé para Portalegre, onde ficava o quartel a que pertencia.

Embarcou para Moçambique, no dia 24 de junho de 1917, integrando o contingente de reforço à 3.ª Expedição que já se encontrava naquele território. Regressou à Metrópole a 21 de março de 1918, muito doente.

Passou ao 2.º Escalão do Exército e ao 7.º Grupo de Bateria, em 31 de dezembro de 1923, e ao depósito de licenciados do R. A., 4 em 1/7/1926.

Passou à reserva territorial em dezembro de 1941.

Condecorações:

·        Medalha Comemorativa das Operações no Sul de Angola 1914-1918;

·        Medalha Comemorativa das Operações em Moçambique 1914-1918. Recebeu também a Medalha da Vitória.

Família:

José Silvestre casou com Maria Rosa, no Posto do Registo Civil de São Vicente da Beira, no dia 6 de maio de 1924. Tiveram 10 filhos:

1. Silvestre Silva dos Santos, que casou com Maria da Piedade Lopes e       tiveram 2 filhas;

      2. Francisco Silva dos Santos, que casou com Carminda de Jesus António e tiveram 3 filhos;

3. José dos Santos, que casou com Maria de Jesus dos Santos e tiveram     3 filhos;

4.    Duas gémeas que morreram com 24 dias de idade;

5. Maia José Silvestre, que casou com José da Assunção António e    tiveram 2 filhos;

      6. João Silvestre Santos, que casou com Maria José dos Santos e     tiveram 2 filhos;

      7. Augusto Santos Silvestre, que casou com Maria da Conceição Martins e tiveram 3 filhos;

      8. Albertino Santos Silvestre, gémeo com o Augusto, faleceu com seis anos          de idade.

«O meu pai queixava-se muito do tempo que esteve em África, sobretudo da fome que por lá passou e do medo que tinha de já não voltar à terra para ver os pais. Mas do que ele nunca se esqueceu foi do desgosto de um dia ter visto um amigo morrer mesmo ao lado dele, e ter que seguir caminho e deixá-lo para trás. Dizia que era isto que faziam quando algum militar morria em combate ou era ferido com gravidade.

Também me lembro de o ouvir contar que, quando andavam pelo mato e se aproximavam de alguma aldeia, às vezes tinham que se esconder ou fingir que eram alemães porque se não eram atacados pelos nativos, que não gostavam muito dos portugueses.

Veio de lá muito doente, com uma doença que por lá arranjou, e passava muito tempo de cama, sem poder ganhar um tostão. Era a minha mãe que tinha que andar a trabalhar no campo, a ver se arranjava qualquer coisa com que matar a fome a tanto filho. Depois também já éramos nós que começámos a trabalhar e a ganhar qualquer coisa, mas, mesmo assim, vivemos sempre com muitas dificuldades porque, ainda por cima, o meu pai nunca conseguiu que lhe dessem uma pensão, apesar do mal que de lá trouxe da guerra, e que o atormentou até ao fim da vida.» (testemunho da filha Maria José)

José Silvestre faleceu no hospital do Fundão, em abril de 1977. Tinha 83 anos de idade.

(Pesquisa feita com a colaboração da filha Maria José Silvestre)

Maria Libânia Ferreira

Do livro: Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra

quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Os Sanvincentinos na Grande Guerra

 José Caetano

José Caetano nasceu no dia 29 de janeiro de 1894. Era filho de Joaquim Caetano e Maria Joana, carvoeiros. De acordo com o registo de batismo, os pais viveriam na Paradanta na altura do seu nascimento, mas, a ser assim, terá sido durante pouco tempo, porque eram naturais do Casal da Serra e foi lá que José Caetano se criou.

Assentou praça em Castelo Branco, no dia 9 de junho de 1914, e foi incorporado no Regimento de Artilharia de Montanha, como Atirador de 3.ª Classe. Na altura era analfabeto e tinha a profissão de jornaleiro. Terminou a recruta em 24 de maio de 1915 e passou ao quadro permanente, em virtude de sorteio.

Foi destacado para Moçambique, integrando a 2.ª Expedição enviada para aquela província ultramarina. Embarcou no dia 7 de outubro de 1915 a bordo do paquete Moçambique, um dos maiores navios portugueses da altura. Durante o período em que esteve em Moçambique, registaram-se muitas baixas, sobretudo por efeito das doenças que atingiram os militares portugueses, mas às quais José Caetano conseguiu sobreviver. Regressou à Metrópole, em 28 de setembro de 1916, após cerca de um ano em África. Desembarcou em Lisboa no dia 5 de novembro.

Passou ao 2.º escalão do Exército e ao 7.º Grupo de Baterias de Reserva, em dezembro de 1924, e ao depósito de Licenciados do Regimento de Artilharia de Montanha, em Outubro de 1926. Em 31 de dezembro de 1935, passou à reserva territorial, por ter atingido o limite de idade.

Condecorações:

  • Medalha comemorativa das operações militares na Província de Moçambique;
  • Medalha da Vitória.

Família:

José Caetano casou com Maria do Nascimento, no Posto do Registo Civil de São Vicente da Beira, a 30 de novembro de 1921. Tiveram 5 filhos, um dos quais faleceu com dois anos de idade. Criaram:

1.    Manuel Caetano que casou com Maria Rosa Barroca;

2.    Maria da Purificação Batista que faleceu ainda jovem;

3.    João Batista da Ressurreição que casou com Ana da Conceição Candeias;

4.    António Batista que casou com Maria do Nascimento Candeias.

José Caetano viveu sempre no Casal da Serra e trabalhou a vida inteira na agricultura, nas terras que herdou e foi comprando. Sobre esse tempo, lembra o filho João Batista:

«Tivemos sempre uma vida boa e uma casa farta, mas de muito trabalho, tanto para o meu pai e para a minha mãe, como para filhos. Trabalhávamos todos para o mesmo e criávamos de tudo para casa e até para vender. Uma vez ainda me desafiaram para ir trabalhar para as minas, que era onde trabalhavam muitos rapazes da minha idade, mas o meu pai disse logo que não me deixava abalar, que depois tinha que andar a pagar ordenados aos estranhos, e mais valia pagar-me a mim. Ele era assim, muito boa pessoa, mas quando dizia uma coisa tinha que se fazer. Acabei por não ir e, se calhar, hoje até lhe dou razão.

Também tivemos sempre uma boa cabrada, com um ou dois pastores, e a minha mãe fazia todos os dias uns poucos de queijos, para casa e para vender. Eram tão afamados que até vinha gente de fora à procura deles, principalmente o pessoal que, naquele tempo, andava por cá a trabalhar nas águas.»

José Caetano enviuvou em março de 1970, após quase 50 anos de casamento. Faleceu pouco tempo depois, em 18 de agosto de 1971. Tinha 77 anos de idade.

Maria Libânia Ferreira

Do livro: Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra

segunda-feira, 3 de maio de 2021

Os nomes das nossas ruas

Terras de heróis anónimos. Quase sempre homens e mulheres de unhas encardidas e mãos calejadas assim que começavam a ser gente. Uma vida a trabalhar de sol a sol para tirar da terra o sustento dos muitos filhos que Deus lhes dava e tantas vezes lhes levava, mal eram postos no mundo ou no correr da infância, mortos de fome. A melhor fatia do que produziam mal dava para pagarem as rendas àqueles que, por uma ordem social e moral velha, que ninguém contestava, se diziam donos delas. Não ficaram para a História imortalizados no nome de uma rua ou de uma praça. É natural, não haveria ruas nem praças que chegassem para escrever os nomes de tanta gente.

Mas deixaram pegadas por todo o lado que são testemunhos da sua passagem por estas terras. Não precisamos de estender muito o olhar para descobrirmos a herança generosa que nos legaram. É por isso que, com frequência, sinto que os nomes das ruas e lugares das várias povoações da nossa freguesia, não sendo de gente ilustre, são memoriais ao trabalho heroico dos nossos antepassados, incluindo os nossos pais e avós, os que nos estão mais próximos.

Certamente porque a História e a Geografia, mas sobretudo o modo de vida, as necessidades, as ambições e as crenças são comuns, os nomes das ruas, repetem-se ou assemelham-se muitas vezes nas várias aldeias da Freguesia: Rua da Eira, Rua da Fonte, Rua do Forno, Rua do Lagar, Rua da Barroca, Ruas dos Olivais, Rua da Igreja… Constatei isso ao percorrê-las:

 

Casal da Serra

«A aldeia era uma rua inclinada de poente para nascente. Semelhava uma cobra rabiscada por mão de criança. Dela se separam algumas ruelas. Em maior número para norte. Para Sul apenas duas, porque o declive era abismal…» (Albano de Matos, em “A casa Grande”).

Esta rua chama-se agora Rua da Fonte. Registos antigos dizem que já se chamou Rua do Forno, por referência a um forno, propriedade da Casa Grande, gente rica, dona de quase todas as terras ali à roda. O forno era particular, mas, em alguns dias, estava ao serviço da população.

Dela, sobem agora a Rua do Forno, a Rua da Capela, a Rua da Barreira, a Rua da Barragem e a Rua do Lagar.

De todas, a Rua da Lagariça, também para norte, é a que melhor testemunha a presença humana, desde há muito tempo, naquele lugar. As lagariças eram pequenos lagares escavados na rocha, onde se espremiam as uvas e fazia o vinho de forma bastante simples. Terão existido muitas na região da Beira Baixa. Algumas desapareceram, mas as que restam são consideradas pontos de interesse para os locais onde se situam. A do Casal da Serra foi coberta por uma camada de cimento…

Para Sul, correm a Rua da Ribeira, a Rua da Graça e a Rua Da Eira.

Neste conjunto de casas, a construção mais pequena, ao centro, terá sido a primeira habitação da família Simão Candeias. Foi ali que, mais tarde, funcionou também a primeira escola do Casal da Serra.

 

A eira que dá nome à rua ainda existe, à direita das casas, e está capaz de receber uma malha. Assim haja trigo, centeio e cevada, e braços fortes para levantar o mangual.  

 

Paradanta


A origem do nome da povoação - pedra de anta, de acordo com informação do José Teodoro - sugere que o lugar será habitado desde há muito. Pouco mais que a Rua Principal, empoleirada na crista de uma elevação que corre no vale, de norte para sul. Meio escondida, surpreende quem por lá passa.

Nasceram-lhe outras duas, pequeninas, quase ao fundo: a Rua da Tapada, para oeste, e a Rua da Fonte, para leste. 

Até há relativamente poucos anos era esta fonte que abastecia a povoação. A água é tão boa, que mesmo quem já não mora na terra ainda lá vai bebê-la e levá-la para casa. O local, junto duma cascata na ribeira, vale uma visita, pela frescura da água e pela beleza e tranquilidade do lugar.

 

Vale de Figueiras

 

Conta-se que o primeiro habitante do Vale de Figueiras veio desterrado de longe por ter matado um pinto de uma mulher rica e avarenta. Já lá irão muitos anos, mas há quem afirme que ainda existem vestígios da casa onde viveu, perto da ribeira. Verdade ou não, as ruínas de algumas habitações e a arquitetura de outras que ainda se aguentam de pé, falam bem da antiguidade do Lugar. Infelizmente falam também do despovoamento.

 

  A justificar o nome da povoação estará o facto de ter nascido no vale da ribeira, num local onde cresceriam algumas figueiras. Trepou depois, encosta acima, como um presépio nos postais de natal; primeiro numa das margens, depois ao longo da outra (talvez nas duas ao mesmo tempo…).

Para além da Rua da Escola, a Rua da Capela, a Rua do Terreiro e a Rua da Ponte, passamos também pela Rua da Várzea, a Rua da Barroca e a Rua do Forno. Esta, que sobe a pique desde a ribeira até ao cimo do povo, já se chamou Rua da Eira, por, quase lá no topo, ter existido uma eira comunitária. O local está agora calcetado.

 

Pereiros

 

É também uma Rua Central, a mais antiga, por onde passavam os moradores do Mourelo ou do Violeiro quando vinham tratar das vidas a São Vicente. Corre o povo quase de Norte para Sul e nela nascem outras mais pequenas para ambos os lados: a Rua da Ribeira, a Rua do Forno, a Rua das Lameiras, a Rua do Barro, a Rua da Laje… todas a provocar a imaginação e a pedir que se contem as histórias de quem por lá andou.

De todas as ruas e recantos dos Pereiros o que mais me encantou foi o Pátio das Cancelas. Não encontrei quem me desse a razão deste nome, mas não custa imaginar que, em tempos passados, fechariam as entradas da povoação com cancelas para protegerem o gado que dormia nas lojas e currais, junto das casas, dos ataques dos lobos esfomeados. Era assim em muitas aldeias isoladas.

 

Foi numa destas casas, agora só paredes que mal se aguentam de pé, que funcionou a escola até aos anos 60 do século passado. Dizem que era uma sala acanhada, cheia de crianças sempre ansiosas pelo toque da campainha. Que animação a daquele Pátio na hora do recreio!

Esta casa, quase de brinquedo, é um exemplo de como se podem aproveitar estas construções antigas para passar uns dias a descansar. Evita-se a derrocada e as terras ficam mais lindas.

(Continua)

M. L. Ferreira 

quarta-feira, 18 de julho de 2018

Voltando aos oragos


Há tempos, a propósito de um artigo do J.M.S., alguém sugeriu que se referissem os oragos das nossas anexas. Pareceu-me haver alguma ironia ou lamento por se falar pouco dessas terras, mas acho que ninguém, melhor que os que lá vivem, para responderem ao desafio e darem conta do que se passa por lá.
Fiquei à espera que alguém desse notícias, mas como ninguém avançou, aqui vai o que consegui saber, provavelmente com algumas imprecisões, mas é de boa vontade. Começando pela que nos fica mais perto:

Pereiros – O orago dos Pereiros é São Lourenço e a festa realiza-se no dia 10 de agosto ou no fim de semana anterior ou no seguinte (este ano parece que é no fim de semana de 11 e 12), por isso, por vezes, coincide com as Festas de Verão da Vila ou com as da Partida.
«Pelo São Lourenço vai à vinha e enche o lenço…» diz-se por lá;

Igreja dos Pereiros com um painel de São Lourenço na fachada principal

Partida – Para além do Santiago, que partilham com o Violeiro, o Vale de Figueiras e o Mourelo, cuja festa mais rija é no 1.º de Maio, a Partida festejam também o dia de São Sebastião, em janeiro, e a Nossa Senhora da Assunção e Santo António, no dia 15 de agosto;
Santiago, em dia de festa, na capela do Cabecinho

Vale de Figueiras – A festa no Vale de Figueiras é em honra do Anjo da Guarda. Antigamente faziam-na em outubro, mas há muito que passou para agosto, no fim de semana a seguir à festa da Partida (parece que atualmente já há alguma dificuldade em encontrar mordomos…);   

Casal da Serra – O orago do Casal da Serra é o Santo António e a festa realiza-se no dia 16 de agosto ou no fim de semana seguinte. Tem sido uma das maiores, mas já dizem que talvez não se realize este ano. Pode ser que não seja verdade…;

Violeiro  A festa no Violeiro é em honra da Nossa Senhora do Bom Sucesso e realiza-se no 2.º fim de semana de agosto. Na procissão sai também a Nossa Senhora de Fátima e os restantes santos da capela. Em janeiro comemoram o dia de S. Vicente;

Mourelo – O padroeiro do Mourelo é Santo António e a festa realizava-se no 1.º fim de semana de agosto, mas há alguns anos que deixou de se fazer…

Imagem de Santo António na fachada da capela do Mourelo. Interessantíssima, pela simplicidade

Tripeiro – A festa no Tripeiro é em honra da Nossa Senhora dos Remédios e, por enquanto, continua a realizar-se no 2.º fim de semana de setembro;

Altar da capela do Tripeiro. A cicerone, orgulhosa da sua capelinha, foi a D. Emília

Quando as gentes do Vale de Figueira passavam por lá, cumprimentavam assim a Senhora:

Ó Senhora dos Remédios,
O vosso altar tem fitas,
O nosso Anjo da Guarda
Manda-vos muitas visitas.

Paradanta – A padroeira da Paradanta é a Senhora dos Aflitos, mas, por falta de festeiros, a festa deixou de se realizar há alguns anos… 

Fachada da capela da Paradanta com um painel da Senhora dos Aflitos

Ainda não percebi bem se o Casal da Fraga também conta como anexa, mas, pelo sim pelo não, não quero deixar para trás a nossa Santa Bárbara, cuja festa se realiza no 3.º fim de semana depois da Páscoa.

Imagem de Santa Bárbara na capela do Casal da Fraga

As festas nos vários lugares coincidiam sempre com o dia do calendário do respetivo santo, mas nas últimas décadas, por causa dos emigrantes, a tendência foi passarem quase todas para o mês de agosto, embora em alguns lugares se diga missa e faça uma procissão no dia que é dado. 
Interessante é vermos que em bastantes terras da freguesia se festeja o Santo António, e, mesmo que não seja o orago, lá está também no altar e sai nas procissões. É de facto um dos principais Santos da Igreja, venerado em todo o mundo católico. Sinto-me honrada quando o encontro fora de Portugal, mas é um pouco frustrante quando, nas legendas, vejo chamarem-lhe sempre Santo António de Pádua.
Há tempos, numa passagem por Madrid, encontrei esta imagem. Acho-a extraordinária, pela alegria que transmite, mas sobretudo porque, finalmente, se desvenda o mistério do sexo dos anjos…

Imagem de Santo António na igreja de São Jerónimo, em Madrid

Nota: Estas informações foram-me dadas por várias pessoas, mas pode haver algumas imprecisões e dados a acrescentar, porque não pude ir a todo o lado e algumas fotografias já foram tiradas há algum tempo.

M. L. Ferreira