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domingo, 20 de março de 2022

Os Sanvincentinos na Grande Guerra

 João Simão

 

João Simão nasceu no Casal da Serra, a 9 de julho de 1893. Era filho de Simão Caetano e Maria Patrocínio, cultivadores.

Assentou praça no dia 9 de julho de 1913 e foi incorporado no 2.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21, em 14 de maio de 1914. Na altura era analfabeto e tinha a profissão de jornaleiro. Pronto da instrução da recruta, em 28 de abril de 1914, veio domiciliar-se em São Vicente da Beira.

Apresentou-se novamente em 5 de maio de 1916, passando à formação do 1.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21, em 11 de outubro.

Mobilizado para a guerra, embarcou para França no dia 21 de janeiro de 1917, integrando a 7.ª Companhia do 2.º Regimento de Infantaria 21, como soldado com o n.º 638 e a chapa de identidade n.º 9543-A.

Do seu Boletim Individual consta apenas o seguinte:

·        Baixa à Ambulância n.º 3, em 13 de janeiro de 1918, sendo evacuado para o Hospital Inglês, no dia 15, e para o Hospital Canadiano n.º 3, em 24. Teve alta no dia 26;

·        Regressou a Portugal, no dia 25 de Fevereiro de 1919, domiciliando-se na freguesia de São Vicente da Beira.



Passou ao 2.º Batalhão em 19/2/1920, à Brigada n.º 1 dos Caminhos-de-Ferro, em três de julho de 1924, e à Inspeção das Tropas de Comunicação, a 1 de Dezembro de 1924. Passou à reserva territorial em 31 de dezembro de 1931.

Condecoração:

Medalha de cobre comemorativa da expedição a França com a legenda França 1917-1918.

Família:

João Simão casou com Maria Pereira, natural da Póvoa de Atalaia, na Conservatória do Registo Civil de Castelo Branco, a 16 outubro de 1920. O casal viveu em Abrantes, localidade onde João Simão trabalhou como funcionário da CP. Não tiveram descendência.

Maria Pereira faleceu no dia 10 de outubro de 1959, no Rossio ao Sul do Tejo. Não foi possível saber a data nem o local da morte de João Simão, mas terá sido na mesma localidade, e em data posterior à da esposa.

 

 Maria Libânia Ferreira

Publicado no livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"

segunda-feira, 3 de maio de 2021

Os nomes das nossas ruas

Terras de heróis anónimos. Quase sempre homens e mulheres de unhas encardidas e mãos calejadas assim que começavam a ser gente. Uma vida a trabalhar de sol a sol para tirar da terra o sustento dos muitos filhos que Deus lhes dava e tantas vezes lhes levava, mal eram postos no mundo ou no correr da infância, mortos de fome. A melhor fatia do que produziam mal dava para pagarem as rendas àqueles que, por uma ordem social e moral velha, que ninguém contestava, se diziam donos delas. Não ficaram para a História imortalizados no nome de uma rua ou de uma praça. É natural, não haveria ruas nem praças que chegassem para escrever os nomes de tanta gente.

Mas deixaram pegadas por todo o lado que são testemunhos da sua passagem por estas terras. Não precisamos de estender muito o olhar para descobrirmos a herança generosa que nos legaram. É por isso que, com frequência, sinto que os nomes das ruas e lugares das várias povoações da nossa freguesia, não sendo de gente ilustre, são memoriais ao trabalho heroico dos nossos antepassados, incluindo os nossos pais e avós, os que nos estão mais próximos.

Certamente porque a História e a Geografia, mas sobretudo o modo de vida, as necessidades, as ambições e as crenças são comuns, os nomes das ruas, repetem-se ou assemelham-se muitas vezes nas várias aldeias da Freguesia: Rua da Eira, Rua da Fonte, Rua do Forno, Rua do Lagar, Rua da Barroca, Ruas dos Olivais, Rua da Igreja… Constatei isso ao percorrê-las:

 

Casal da Serra

«A aldeia era uma rua inclinada de poente para nascente. Semelhava uma cobra rabiscada por mão de criança. Dela se separam algumas ruelas. Em maior número para norte. Para Sul apenas duas, porque o declive era abismal…» (Albano de Matos, em “A casa Grande”).

Esta rua chama-se agora Rua da Fonte. Registos antigos dizem que já se chamou Rua do Forno, por referência a um forno, propriedade da Casa Grande, gente rica, dona de quase todas as terras ali à roda. O forno era particular, mas, em alguns dias, estava ao serviço da população.

Dela, sobem agora a Rua do Forno, a Rua da Capela, a Rua da Barreira, a Rua da Barragem e a Rua do Lagar.

De todas, a Rua da Lagariça, também para norte, é a que melhor testemunha a presença humana, desde há muito tempo, naquele lugar. As lagariças eram pequenos lagares escavados na rocha, onde se espremiam as uvas e fazia o vinho de forma bastante simples. Terão existido muitas na região da Beira Baixa. Algumas desapareceram, mas as que restam são consideradas pontos de interesse para os locais onde se situam. A do Casal da Serra foi coberta por uma camada de cimento…

Para Sul, correm a Rua da Ribeira, a Rua da Graça e a Rua Da Eira.

Neste conjunto de casas, a construção mais pequena, ao centro, terá sido a primeira habitação da família Simão Candeias. Foi ali que, mais tarde, funcionou também a primeira escola do Casal da Serra.

 

A eira que dá nome à rua ainda existe, à direita das casas, e está capaz de receber uma malha. Assim haja trigo, centeio e cevada, e braços fortes para levantar o mangual.  

 

Paradanta


A origem do nome da povoação - pedra de anta, de acordo com informação do José Teodoro - sugere que o lugar será habitado desde há muito. Pouco mais que a Rua Principal, empoleirada na crista de uma elevação que corre no vale, de norte para sul. Meio escondida, surpreende quem por lá passa.

Nasceram-lhe outras duas, pequeninas, quase ao fundo: a Rua da Tapada, para oeste, e a Rua da Fonte, para leste. 

Até há relativamente poucos anos era esta fonte que abastecia a povoação. A água é tão boa, que mesmo quem já não mora na terra ainda lá vai bebê-la e levá-la para casa. O local, junto duma cascata na ribeira, vale uma visita, pela frescura da água e pela beleza e tranquilidade do lugar.

 

Vale de Figueiras

 

Conta-se que o primeiro habitante do Vale de Figueiras veio desterrado de longe por ter matado um pinto de uma mulher rica e avarenta. Já lá irão muitos anos, mas há quem afirme que ainda existem vestígios da casa onde viveu, perto da ribeira. Verdade ou não, as ruínas de algumas habitações e a arquitetura de outras que ainda se aguentam de pé, falam bem da antiguidade do Lugar. Infelizmente falam também do despovoamento.

 

  A justificar o nome da povoação estará o facto de ter nascido no vale da ribeira, num local onde cresceriam algumas figueiras. Trepou depois, encosta acima, como um presépio nos postais de natal; primeiro numa das margens, depois ao longo da outra (talvez nas duas ao mesmo tempo…).

Para além da Rua da Escola, a Rua da Capela, a Rua do Terreiro e a Rua da Ponte, passamos também pela Rua da Várzea, a Rua da Barroca e a Rua do Forno. Esta, que sobe a pique desde a ribeira até ao cimo do povo, já se chamou Rua da Eira, por, quase lá no topo, ter existido uma eira comunitária. O local está agora calcetado.

 

Pereiros

 

É também uma Rua Central, a mais antiga, por onde passavam os moradores do Mourelo ou do Violeiro quando vinham tratar das vidas a São Vicente. Corre o povo quase de Norte para Sul e nela nascem outras mais pequenas para ambos os lados: a Rua da Ribeira, a Rua do Forno, a Rua das Lameiras, a Rua do Barro, a Rua da Laje… todas a provocar a imaginação e a pedir que se contem as histórias de quem por lá andou.

De todas as ruas e recantos dos Pereiros o que mais me encantou foi o Pátio das Cancelas. Não encontrei quem me desse a razão deste nome, mas não custa imaginar que, em tempos passados, fechariam as entradas da povoação com cancelas para protegerem o gado que dormia nas lojas e currais, junto das casas, dos ataques dos lobos esfomeados. Era assim em muitas aldeias isoladas.

 

Foi numa destas casas, agora só paredes que mal se aguentam de pé, que funcionou a escola até aos anos 60 do século passado. Dizem que era uma sala acanhada, cheia de crianças sempre ansiosas pelo toque da campainha. Que animação a daquele Pátio na hora do recreio!

Esta casa, quase de brinquedo, é um exemplo de como se podem aproveitar estas construções antigas para passar uns dias a descansar. Evita-se a derrocada e as terras ficam mais lindas.

(Continua)

M. L. Ferreira 

domingo, 10 de maio de 2020

Os Sanvicentinos na Grande Guerra

Bernardo da Cruz


Bernardo da Cruz nasceu no Casal da Serra, a 1 de dezembro de 1894. Era filho de Bartolomeu Cruz e Anna de Jesus, esta natural de Alcongosta.
Segundo a sua folha de matrícula, era analfabeto e tinha a profissão de jornaleiro quando se alistou em 9 de julho de 1914. Ficou pronto da recruta no dia 12 de maio de 1915 e foi licenciado nesse mesmo dia, indo domiciliar-se no Casal da Serra.
Apresentou-se novamente em 1916 e, fazendo parte do CEP, embarcou para França no dia 21 de janeiro de 1917, integrado na 1.ª Companhia do 2.º Batalhão do Regimento de Infantaria 21, como soldado com o n.º 379 e a placa de identidade n.º 8872-A.
Do seu boletim individual e folha de matrícula militar consta o seguinte:
a)    Baixa ao hospital, em Março de 1917, onde permaneceu por quatro dias;
b)    Em Junho, ficou adido junto do Quartel-General da 1.ª Divisão, onde prestou serviço até Fevereiro de 1918. Seguiu depois para a sua Unidade, onde chegou no dia 9 desse mês;
c)    Em Abril, foi colocado no Batalhão de Infantaria 11, 1.ª Companhia. Talvez por esta mudança de batalhão, terá sido um dos poucos vicentinos a participar na batalha de La Lyz, que ocorreu no dia nove desse mês;
d)    Em três de Maio, foi internado na ambulância n.º 6, onde permaneceu cinco dias. Foi dado como incapaz e ficou a aguardar o repatriamento, aprovado nos termos da circular 475/11 de 25/05 /1918.
e)    Embarcou para Portugal, a bordo do navio Gil Eanes, e chegou a Lisboa no dia 23 de Julho de 1918. 
Condecorações:
·      Medalha Militar de cobre com a legenda: França 1917-1918;
·      Medalha da Vitória.
O seu boletim individual do CEP não o refere, mas, de acordo com a relação dos militares que participaram no raide de 9 de março de 1918, apresentada em "A Covilhã e a I Grande Guerra 1914/1918", Bernardo Cruz também participou no referido raide e deve, por isso, ter sido louvado.


Quando chegou à terra, vinha ainda convalescente dos ferimentos e bastante perturbado pelos gases e traumas de guerra. Apesar disso, ainda foi castigado por faltar à inspeção no ano de 1921, tendo sido considerado ausente e sem domicílio conhecido. Passou à reserva ativa, em 1928, e em 1931 foi considerado incapaz. Em 1939, foi internado no Asilo de Inválidos Militares Princesa Maria Benedita, em Runa, de onde saiu em 1945, por vontade própria.
Na sua folha de matrícula constam ainda alguns castigos durante este período de internamento psiquiátrico:
a)    Punido pelo comandante do asilo, em fevereiro de 1942, com privação de vinho por 30 dias, por levar para fora do refeitório a ração de manteiga que lhe estava atribuída e tentar vendê-la a outros internados;
b)    Punido com 15 dias de detenção, porque tendo-lhe sido chamada a atenção por um seu superior, por o não ter cumprimentado militarmente, tomou a rigorosa posição de sentido e, com ar de troça, fez e desfez a continência 2 vezes, perguntando, no fim, ao superior se estava satisfeito;
c)    Punido com 5 dias de prisão disciplinar, por não ter cumprido prontamente a ordem de formatura para a 2.ª refeição, dizendo que não estava ali para isso.
Terá posteriormente sido internado na Casa de Saúde do Telhal, onde passou o resto da vida. Ainda recebeu a visita de alguns familiares, mas nunca mais voltou à terra. 



Dizem que era uma pessoa muito religiosa e, durante o tempo em que permaneceu no Casal da Serra, passava os dias a ensinar a doutrina às crianças. Quando elas aprendiam bem as orações, até lhes dava umas moedas para comprarem rebuçados. Também há quem diga que foi ele que ofereceu a Sagrada Família que, durante muitos anos, andou de casa em casa, no Casal da Serra.
Bernardo Cruz faleceu na freguesia do Algueirão, no dia 22 de janeiro 1970.


(Pesquisa feita com a colaboração de vários moradores do Casal da Serra)


Maria Libânia Ferreira
Do livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"

domingo, 19 de abril de 2020

Os Sanvicentinos na Grande Guerra

 Basílio Leitão

Basílio Leitão nasceu no Casal da Serra, a 25 de abril de 1893. Era filho de José Leitão e Maria dos Santos, cultivadores.

Assentou praça em Castelo Branco, no dia 9 de julho de 1913, e foi incorporado no Regimento de Artilharia de Montanha em 13 de janeiro de 1914. Segundo a sua folha de matrícula, era analfabeto e tinha a profissão de jornaleiro. Foi vacinado.
Foi destacado para Angola, e embarcou no dia 11 de setembro de 1914, integrado na 1.ª Expedição que seguiu para aquela província ultramarina. Tinha o posto de soldado atirador de 3.ª classe. Desembarcou no porto de Moçâmedes, a 1 de outubro, seguindo depois para sul, a fim de reforçar a força militar que já se encontrava na fronteira daquele território, ameaçado pelas tentativas de ocupação alemã, a partir da Namíbia. 
Participou na ação do dia 18 de dezembro de 1914 contra os alemães, fazendo parte das tropas que ocuparam o vau de Caluéque. Regressou à metrópole, em 11 de agosto de 1915, e foi licenciado em 12 de dezembro.
Apresentou-se novamente em 16 de fevereiro de 1917, por ter sido convocado para serviço extraordinário. Foi destacado para Moçambique, e embarcou a 2 de julho (nesta altura já era casado) no contingente de reforço à 3ª expedição enviada para aquela província ultramarina. Regressou no dia 24 de outubro de 1918.
Condecorações:
·      Medalha comemorativa da campanha do exército português com a legenda: Angola 1914;
·      Medalha comemorativa das campanhas em Moçambique;
·      Medalha da Vitória.
·      Por o seu regimento ter sido condecorado com a Cruz de Guerra de 1.ª classe, ficou ao abrigo do art.º 43 do regulamento das Ordens Militares Portuguesas de 1919.

Família:
Basílio Leitão casou com Maria Inês, natural do Louriçal do Campo, no dia 21 de Outubro de 1915, após ter regressado de Angola, e tiveram nove (?) filhos: Tomás, António, José (faleceu com 14 anos), Maria Ascensão, João, Joaquim, Manuel, Maria do Céu e Francisco.
«O meu pai vinha muito doente, quando voltou da guerra, e por isso teve sempre muitas dificuldades em arranjar trabalho certo. O único ofício que teve foi o de sapateiro de tamancos, mas o que ganhava mal lhe dava para os gastos dele. O que nos valia era a minha mãe, que se fartava de trabalhar nos terços e por onde o apanhava, para arranjar qualquer coisa para matar a fome a tanto filho. E nós, mal podíamos, começávamos também logo a trabalhar: os mais novos a guardar as cabras de um rebanho que tínhamos a meias com outros vizinhos; depois, no campo, como jornaleiros, nos quintos e na azeitona. Foi uma vida muito difícil, a nossa!» (Testemunho do filho Manuel Leitão)
Basílio Leitão faleceu no dia 7 de Outubro de 1963. Tinha 70 anos de idade.

Maria Libânia Ferreira
Do livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"

terça-feira, 14 de abril de 2020

Os Sanvicentinos na Grande Guerra


 António Simão de Matos


António Simão de Matos nasceu no Casal da Serra, a 8 de janeiro de 1892. Era filho de Simão de Matos, cultivador, e de Leonor Maria.
Assentou praça em Castelo Branco, a 12 de junho de 1912, e foi incorporado no Grupo de Baterias de Artilharia de Montanha. Na altura era analfabeto e tinha a profissão de jornaleiro.
Ficou pronto da instrução da recruta em 30 de maio de 1913, e foi licenciado no dia seguinte, indo domiciliar-se no Casal da Serra. 
Passou ao Regimento de Artilharia de Montanha, em 1 de novembro de 1913, e foi destacado para Moçambique, integrando a 1.ª Expedição enviada para aquela província ultramarina.
Embarcou no dia 11 de setembro de 1914, a bordo do navio inglês Durban Castle. Após mais de um mês de viagem chegou a Lourenço Marques e daí seguiu viagem para Porto Amélia, a norte de Moçambique. Embarcou de regresso à Metrópole, em 9 de novembro de 1915, e foi licenciado a 11 de março de 1916.
Foi novamente mobilizado para seguir para Moçambique, para onde partiu a 2 de Julho de 1917, fazendo parte do contingente de reforço à 3.ª Expedição que tinha saído de Lisboa em maio de 1916 e se encontrava bastante debilitada na sequência das baixas por morte, exaustão e doenças de que sofriam muitos militares que a integravam. Regressou à Metrópole no dia 22 de Janeiro de 1919.
Condecorações:
·      Medalha comemorativa das campanhas realizadas em Moçambique.
·      Medalha da Vitória.

Família:
António de Matos casou com Celeste da Conceição, no dia 24 de novembro de 1920, e tiveram 6 filhos, um dos quais faleceu com apenas dois anos de idade. Criaram:
1.    Maria Celeste de Matos Barroso, que casou com Francisco da Conceição Barroso e tiveram cinco filhos;
2.    Joaquim António de Matos, que casou com Maria de Jesus e tiveram dois filhos;
3.    Ana Celeste da Conceição, que casou com Manuel Gonçalves e tiveram um filho (mãe e filho foram assassinados em Maputo, Moçambique, onde viviam).
4.    José António Matos, que casou com Maria Josefa de Jesus Simão de Matos e tiveram dois filhos que chegaram à idade adulta;
5.    Luís António de Matos, que faleceu ainda jovem.

«As minhas primas e eu temos o mesmo nome, porque tanto os meus tios como o meu pai quiseram prestar homenagem à minha avó que faleceu em 1946, ainda muito nova. Assim, somos três primas todas chamadas Celeste!
O meu avô fez o serviço militar em Évora e depois foi mobilizado para ir para África, onde esteve duas vezes.
No fim da primeira incorporação, foram rendidos por uma outra incorporação e dois anos depois foram eles que renderam novamente os da segunda incorporação. Quando acabou a segunda incorporação do meu avô, também acabou a guerra. Contava que os oficiais não demonstraram grande alegria pelo fim da guerra, contrariamente aos soldados (provavelmente pelo fim de algumas vantagens que acabariam).
Um irmão mais novo do meu avô, de nome José de Matos, também esteve na guerra em Moçambique, na mesma altura e no mesmo lugar que o meu avô. Voltaram os dois com vida, infelizmente não chegaram a tempo de abraçar o pai deles, Simão de Matos, que faleceu antes do regresso dos filhos.
Conta o meu pai que o meu avô nunca foi muito de falar do tempo em que andou na Guerra, mas lembra-se de o ouvir dizer que no dia em que desembarcou em Lisboa, vindo de Moçambique, um homem chegou ao pé dele a pedir-lhe um cigarro. Enquanto o acendia, o tal homem perguntou-lhe se não gostaria de ir para a GNR, que, se quisesse, ele encarregava-se de o meter lá. A resposta do meu avô foi logo:
- Farto de fardas estou eu! O que quero é voltar para a minha terra o mais depressa possível, para matar saudades da minha família. 
Viveu sempre no Casal da Serra, a trabalhar no campo, mas gostava de viajar. Ainda foi uma vez a França, onde esteve três meses na casa do filho Joaquim.
Quando ele morreu, eu ainda era muito novinha e vivia com os meus pais em França, mas lembro-me bem dele. Era um homem bonito, andava sempre bem vestido e era muito meigo. Quando vínhamos de férias a Portugal, mimava-nos muito e ficava sempre a chorar quando abalávamos. Houve um ano em que ele ficou muito triste e não disse «Até pró ano», como costumava dizer. Achei estranho… Morreu passados uns meses e já não o voltámos a ver.» (Testemunho da neta Celeste Simão de Matos)

António Simão de Matos faleceu no dia 16 de janeiro de 1981. Tinha 89 anos.

(Pesquisa feita com a colaboração do filho José António Matos e da neta Celeste Matos)

Maria Libânia Ferreira
Do livro "Os Combatentes de São Vicente da Beira na Grande Guerra"

quarta-feira, 18 de julho de 2018

Voltando aos oragos


Há tempos, a propósito de um artigo do J.M.S., alguém sugeriu que se referissem os oragos das nossas anexas. Pareceu-me haver alguma ironia ou lamento por se falar pouco dessas terras, mas acho que ninguém, melhor que os que lá vivem, para responderem ao desafio e darem conta do que se passa por lá.
Fiquei à espera que alguém desse notícias, mas como ninguém avançou, aqui vai o que consegui saber, provavelmente com algumas imprecisões, mas é de boa vontade. Começando pela que nos fica mais perto:

Pereiros – O orago dos Pereiros é São Lourenço e a festa realiza-se no dia 10 de agosto ou no fim de semana anterior ou no seguinte (este ano parece que é no fim de semana de 11 e 12), por isso, por vezes, coincide com as Festas de Verão da Vila ou com as da Partida.
«Pelo São Lourenço vai à vinha e enche o lenço…» diz-se por lá;

Igreja dos Pereiros com um painel de São Lourenço na fachada principal

Partida – Para além do Santiago, que partilham com o Violeiro, o Vale de Figueiras e o Mourelo, cuja festa mais rija é no 1.º de Maio, a Partida festejam também o dia de São Sebastião, em janeiro, e a Nossa Senhora da Assunção e Santo António, no dia 15 de agosto;
Santiago, em dia de festa, na capela do Cabecinho

Vale de Figueiras – A festa no Vale de Figueiras é em honra do Anjo da Guarda. Antigamente faziam-na em outubro, mas há muito que passou para agosto, no fim de semana a seguir à festa da Partida (parece que atualmente já há alguma dificuldade em encontrar mordomos…);   

Casal da Serra – O orago do Casal da Serra é o Santo António e a festa realiza-se no dia 16 de agosto ou no fim de semana seguinte. Tem sido uma das maiores, mas já dizem que talvez não se realize este ano. Pode ser que não seja verdade…;

Violeiro  A festa no Violeiro é em honra da Nossa Senhora do Bom Sucesso e realiza-se no 2.º fim de semana de agosto. Na procissão sai também a Nossa Senhora de Fátima e os restantes santos da capela. Em janeiro comemoram o dia de S. Vicente;

Mourelo – O padroeiro do Mourelo é Santo António e a festa realizava-se no 1.º fim de semana de agosto, mas há alguns anos que deixou de se fazer…

Imagem de Santo António na fachada da capela do Mourelo. Interessantíssima, pela simplicidade

Tripeiro – A festa no Tripeiro é em honra da Nossa Senhora dos Remédios e, por enquanto, continua a realizar-se no 2.º fim de semana de setembro;

Altar da capela do Tripeiro. A cicerone, orgulhosa da sua capelinha, foi a D. Emília

Quando as gentes do Vale de Figueira passavam por lá, cumprimentavam assim a Senhora:

Ó Senhora dos Remédios,
O vosso altar tem fitas,
O nosso Anjo da Guarda
Manda-vos muitas visitas.

Paradanta – A padroeira da Paradanta é a Senhora dos Aflitos, mas, por falta de festeiros, a festa deixou de se realizar há alguns anos… 

Fachada da capela da Paradanta com um painel da Senhora dos Aflitos

Ainda não percebi bem se o Casal da Fraga também conta como anexa, mas, pelo sim pelo não, não quero deixar para trás a nossa Santa Bárbara, cuja festa se realiza no 3.º fim de semana depois da Páscoa.

Imagem de Santa Bárbara na capela do Casal da Fraga

As festas nos vários lugares coincidiam sempre com o dia do calendário do respetivo santo, mas nas últimas décadas, por causa dos emigrantes, a tendência foi passarem quase todas para o mês de agosto, embora em alguns lugares se diga missa e faça uma procissão no dia que é dado. 
Interessante é vermos que em bastantes terras da freguesia se festeja o Santo António, e, mesmo que não seja o orago, lá está também no altar e sai nas procissões. É de facto um dos principais Santos da Igreja, venerado em todo o mundo católico. Sinto-me honrada quando o encontro fora de Portugal, mas é um pouco frustrante quando, nas legendas, vejo chamarem-lhe sempre Santo António de Pádua.
Há tempos, numa passagem por Madrid, encontrei esta imagem. Acho-a extraordinária, pela alegria que transmite, mas sobretudo porque, finalmente, se desvenda o mistério do sexo dos anjos…

Imagem de Santo António na igreja de São Jerónimo, em Madrid

Nota: Estas informações foram-me dadas por várias pessoas, mas pode haver algumas imprecisões e dados a acrescentar, porque não pude ir a todo o lado e algumas fotografias já foram tiradas há algum tempo.

M. L. Ferreira